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“Não sei o que quer que lhe devolva – cartas ou que mais. Eu preferia não lhe devolver nada, e conservar as suas cartinhas como memória viva de um passado morto, como todos os passados; como alguma coisa de comovedor numa vida, como a minha, em que o progresso nos anos é par do progresso na infelicidade e na desilusão.” - Fernando Pessoa em 29/11/1920, terminando o namoro pela primeira vez. | Arquivo Pessoal Fernando Pessoa e Ofélia Queiróz
“Não sei o que quer que lhe devolva – cartas ou que mais. Eu preferia não lhe devolver nada, e conservar as suas cartinhas como memória viva de um passado morto, como todos os passados; como alguma coisa de comovedor numa vida, como a minha, em que o progresso nos anos é par do progresso na infelicidade e na desilusão.” - Fernando Pessoa em 29/11/1920, terminando o namoro pela primeira vez.| Foto: Arquivo Pessoal Fernando Pessoa e Ofélia Queiróz

Cartas

Fernando Pessoa & Ofélia Queiróz – Correspondência Amorosa Completa, 1919-1935Organização de Richard Zenith. Editora Capivara, 544 págs., R$ 140.

"Todas as cartas de amor são ridículas, não seriam cartas de amor se não fossem ridículas. Também escrevi em meu tempo cartas de amor. Como as outras, ridículas...", revelou o poeta Fernando Pessoa em texto publicado após a sua morte em 1935.

Se é verdade que pensava assim, o grande poeta luso soube, pois, correr o risco. Durante 16 anos manteve uma vasta correspondência com Ofélia Queiróz, uma moça lisboeta que foi, ao que tudo indica, sua única namorada.

Todas as cartas trocadas pelo casal estão reunidas pela primeira vez no livro Fernando Pessoa & Ofélia Queiróz – Correspondência Amorosa Completa, 1919-1935.

Ao todo, são 348 documentos transcritos integralmente, entre os quais 156 permaneciam inéditos. Também são reproduzidas pela primeira vez todas as cartas manuscritas por Pessoa que permitem um inédito contato com a caligrafia original do poeta.

O livro foi idealizado pelo casal brasileiro Bia e Pedro Correa do Lago que adquiriu, há cerca de dez anos, em um leilão na Sotheby’s, em Londres, o lote com as cartas da lavra de Pessoa.

Anos mais tarde, eles também conseguiram comprar a produção missivista de Ofélia e decidiram lançar o livro como parte das comemorações do ano de Portugal no Brasil (2012/13). "Com estas cartas se vai formando dados faltantes da biografia do Pessoa", diz Bia Correa do Lago na apresentação do livro.

De acordo com o prefácio da obra, escrito pelo intelectual português Eduardo Lourenço, um dos maiores especialistas na obra de Pessoa, uma das facetas desconhecidas do autor luso vem à tona na leitura de sua correspondência romântica.

"Vemos um Pessoa nu e sem máscara", longe de suas preocupações literárias e tendo que lidar com os assuntos prosaicos dos namoros e outras agruras do homem comum. A organização dos textos coube à Richard Zenith, também pesquisador da biografia do poeta.

Namoro

O namoro entre Pessoa e Ofélia aconteceu em duas fases. A primeira inicia-se em 1920 quando ambos se conhecem no escritório onde o poeta trabalha como tradutor e ela é contratada como secretária. O encanto foi recíproco e imediato, apesar dos doze anos de idade e algumas outras diferenças intelectuais.

E se traduziu em uma troca epistolar que mostra uma Ofélia comportando-se como uma moça de seu tempo: ela bombardeia obsessivamente o namorado com cobranças sobre casamento e uma vida em família.

A insistência cansa Pessoa, preocupado sempre com suas aspirações literárias. Terminam o romance em 1920 e retomam a relação em 1929, para encerrá-la um ano depois.

Para Bia Correa do Prado, "ainda que o afeto dele por ela seja verdadeiro, o tempo que pode dedicar-lhe nesta segunda fase é praticamente nenhum". Ofélia ainda tem esperanças, mas não ilusões.

O livro traz ainda um inédito texto de Ofélia já idosa, em que ela rebate o poema citado no início deste texto, que sente ter sido escrito para ela. "Mais ridículo é quem nunca escreveu uma carta de amor", conclui Ofélia.

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