Você já passou dos 40 anos e está difícil conseguir um emprego? A solução pode ser eliminar a concorrência. Literalmente. É o que decide fazer o personagem central de O Corte, co-produção da França, Espanha e Bélgica, o novo filme de Konstantin Costa-Gavras, que estréia hoje em Curitiba, dentro da programação do Teatro do HSBC. Reconhecido pelo seu cinema político e social – em filmes como Z, Missing – Desaparecido e Amém –, o diretor grego apresenta ao espectador uma crítica ácida ao sistema econômico dominante atualmente, utilizando-se da ironia e do humor negro.

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O mais interessante é saber que Bruno Davert (vivido pelo ator José Garcia, famoso comediante na França), protagonista da história de O Corte, não é um Zé Ninguém à procura de um simples trabalho. Ele tem ótimas qualificações e muita experiência. Engenheiro da indústria de alimentos, foi demitido devido aos tradicionais cortes das empresas em busca da modernidade em seus processos. Pensou que com seu ótimo currículo arrumaria um novo emprego facilmente, mas lá se vão dois anos de muitas entrevistas e nenhum cargo obtido.

Bruno ainda passa por uma crise conjugal, pois a família é sustendada pela mulher, Marlène (Karin Viard), que se divide em dois empregos menores para colocar comida na mesa para os dois filhos adolescentes, Maxime e Betty. O relacionamento amoroso vai sendo corroído aos poucos, à medida que aumentam os fracassos do até então cabeça do casal.

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Não passa pela cabeça de Davert arrumar um emprego pior. Para que teria estudado, trabalhado bem e conseguido suas qualificações? Desesperado e decidido a mudar as coisas, ele tem uma idéia que lhe parece genial: matar um reconhecido profissional de sua área, para ficar com o emprego dele na empresa. Mas há um problema: assim que a vaga for aberta, haverá vários candidatos de porte ao trabalho, tão qualificados quanto ele. Resta então descobrir quem são esses potenciais rivais e eliminá-los, também.

A situação apresentada por Costa-Gavras é extrema e a solução proposta absurda, mas o pensamento do personagem segue uma lógica não muito distante do que tem pregado uma sociedade cada vez mais individualista, que parece sempre privilegiar o mais esperto ou aquele que tem a tão comentada atitude. E atitude é o que não falta a Davert, que acredita piamente estar fazendo a coisa certa e tem poucos momentos de dúvida sobre isso – afinal, está defendendo a própria sobrevivência e de sua família.

O diretor constrói muito bem os personagens e a trama, ambos baseados no livro The Ax, do escritor americano Donald E. Westlate. Mesmo trágica, a história vai se tornando divertida à medida que o engenheiro vai conseguindo seu intento, tendo que lidar com as complicações cada vez maiores que vão aparecendo em seu caminho – a mulher o obriga a visitar um terapeuta sexual, o filho vira um deliqüente, a polícia parece estar em seu encalço. Não que se chegue a torcer pelo assassino, mas, em certos momentos, é possível ter até uma certa identificação por ele.

Pena que o ótimo filme de Costa-Gavras deva ter uma curta temporada na capital. O Teatro do HSBC programa sessões apenas de hoje até o próximo sábado (consulte horários e preços no roteiro). Algum outro cinema local poderia tentar exibir a fita a partir das próximas semanas. GGGG