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Sting: sem dom para as rimas | Arquivo Gazeta do Povo
Sting: sem dom para as rimas| Foto: Arquivo Gazeta do Povo

Antítese de uma paixão

"O amor é uma torrente contínua". A frase do filme Love Streams, de John Cassavettes, funciona como uma espécie de mantra para os personagens Rímini e Sofía no livro O Passado, do escritor argentino Alan Pauls (Cosac Naify, 530 págs., R$ 55). A afirmação aparece diversas vezes ao longo do romance, normalmente antes de uma nova aparição de Sofía – a mulher-zumbi, como pensou chamá-la o escritor – que, após um relacionamento de 12 anos, não consegue se desligar do ex.

O tom obsessivo do livro não deixa espaço para dúvidas: amor e horror caminham juntos. Com frases trabalhadas e uma escrita clássica, Pauls acompanha os anos que se seguem à separação do casal: os novos relacionamentos de Rímini, o esquecimento dos idiomas, o casamento, o filho. E o "eterno retorno" de Sofía.

O livro foi lançado este ano no Brasil, e o escritor esteve presente na edição mais recente da Flip, onde dividiu a mesa com a psicanalista Maria Rita Kehl, para discutir as fronteiras, nem sempre claras, entre amor, desamor e doença.

O diretor Hector Babenco conheceu Pauls através de uma entrevista que deu na ocasião do lançamento do filme Coração Iluminado, de 1998. O diretor se surpreendou ao ler a reportagem escrita por Pauls: com um estilo elegante, o escritor não havia transcrito literalmente nenhuma das suas falas. Guardou o nome e, alguns anos depois, comprou o livro O Passado e se apaixonou pela história de amor/terror, que adaptou ao cinema.

Gael, Autran e atrizes assustadas

Gael García Bernal ganhou uma aura cult no cinema em filmes como Amores Brutos e E Sua Mãe Também. O ator mexicano é a grande estrela de O Passado, como comprovaram os eventos de imprensa realizados semana passada, em São Paulo. Bernal estava sempre cercado pelos fotógrafos e, algumas vezes, não escondia o ar de espanto pelo rebuliço que sua presença estava causando.

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Depois do enorme sucesso de Carandiru, filme grandioso que levou quase 5 milhões de espectadores aos cinemas do Brasil em 2003, transformando-se na segunda maior bilheteria da retomada do cinema nacional, Hector Babenco retorna às telas com um projeto mais intimista. O Passado, principal estréia amanhã no circuito nacional, é um longa-metragem estrelado pelo ator mexicano Gael García Bernal. O roteiro é uma adaptação do romance homônimo do escritor argentino Alan Pauls, sobre o personagem Rímini, jovem que assiste impassível sua vida ser dominada pelas mulheres com quem se envolve.

Assim como em Coração Iluminado (1998), Babenco retorna ao seu país natal para contar novamente uma história mais sentimental. "Digamos que, quando filmo na Argentina, eu falo do amor. No Brasil, falo de indignação", revela o cineasta em entrevista exclusiva ao Caderno G. Segundo ele, o ponto de contato das duas produções está no fato de ambas apresentarem uma visão mais subjetiva do mundo, com histórias mais relacionadas ao amor e ao afeto. "Elas não estão inseridas numa narrativa que trata de dramas sociais e coisas de exclusão. Talvez, quando vou à Argentina, é porque estou querendo fazer filmes íntimos, que questionem um pouco mais o sentido das coisas", continua.

Ao ler O Passado pela primeira vez (veja quadro ao lado), Babenco diz não ter visualizado um filme. Mas, após uma nova leitura, passou a identificar algumas "polaróides". "O livro é muito subjetivo, muito o pensamento do Pauls, uma divagação constante. Mas havia momentos fortes. Por exemplo: uma mulher que encontra o ex-marido e lhe diz determinadas coisas, e lhe implora para que a leve ao hotel, dizendo que nunca mais transou", conta.

A primeira intenção do diretor era filmar a produção no Brasil, e Curitiba até foi cogitada como cenário, pois o cineasta não via a história de Rímini sendo contada no Rio de Janeiro ou São Paulo. "Pensei que poderia ser interessante fazer em uma cidade menor, com clima e uma atmosfera um pouco mais opressiva. Curitiba tem a coisa do inverno, e, sempre que visitei a cidade, ela me indicava uma coisa mais fechada", confirma. Mas Babenco decidiu mesmo filmar em Buenos Aires, onde O Passado foi escrito, e onde o diretor nasceu e iniciou sua carreira.

Essa decisão levou a alterações no roteiro, escrito em português pelo cineasta em conjunto com a jornalista e escritora Marta Góes. A dupla passou mais quatro meses retrabalhando o texto com o escritor local Federico Léon – e Babenco finalizou a parte final do roteiro com a escritora argentina Mariana Chaud. "Essa história tem todos os elementos do melodrama, que é o gênero latino-americano por excelência, Há ciúme, vingança, morte, abandono, retorno. É um tango, um bolero, um prato com todos os ingredientes possíveis. Tentei tirar toda a graça, toda o óbvio, deixar o filme o mais seco possível", comenta o diretor sobre o resultado final da nova obra.

Babenco crê que é importante que o cinema no Brasil deixe de lado uma necessidade – em sua opinão, quase convulsiva – de falar do que está acontecendo na própria calçada, como se todos fossem observadores de um mundo bárbaro, cruel, de uma devastação social. "Se a gente pensar um pouco mais os personagens, e nos determos a contar os seus conflitos, os seus silêncios, acho que começaríamos a conhecer melhor a alma das pessoas que retratamos em contextos maiores", afirma, citando O Céu de Suely (Karin Aïnouz) como um filme que segue essa linha. "Estou um pouco saturado desse cinema que quer contar a barbárie, a tragédia. Acho muito mais misterioso e difícil ir ao pequeno do que ficar falando do grandioso, por mais cruel que ele seja", prossegue.

DVD

A maior parte da importante e premiada cinematografia de Hector Babenco – O Rei da Noite (1975), Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia (1977), Pixote, a Lei do Mais Fraco (1980), O Beijo da Mulher Aranha (1985), Ironweed (1987), Brincando nos Campos do Senhor (1991) e Coração Iluminado (1998) – ainda está distante das locadoras.

O cineasta confessa ainda não ter se envolvido muito no processo de passagens de seus longas em DVD, mas garante que vai se dedicar a esse trabalho após o lançamento de O Passado. "O mercado está muito carente disso, tenho recebido constantemente muitos pedidos. Tenho que restaurar Pixote e O Beijo da Mulher Aranha, mas não estou conseguindo recursos", confirma, lembrando que, após três anos de envolvimento no projeto do novo filme, ainda não tem nenhum outro projeto em mente para cinema.

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