Um não lugar. Essa parece ser a definição mais pertinente, mesmo que não tão justa, para as amareladas e sujas galerias subterrâneas dos terminais de transporte coletivo da cidade. Os longos corredores, locais de rápida passagem, lembram uma caixa vazia, a princípio descartável, mas que, desde o final do ano passado, têm recebido uma nova função: disseminar arte.
Já desenvolvido nos terminais Capão Raso, Vila Hauer e Campina do Siqueira, o projeto de arte urbana Travessias Subterrâneas, promovido pela Fundação Cultural de Curitiba (FCC) por meio do Programa de Apoio e Incentivo à Cultura, chega agora ao terminal do Cabral e do Campo Comprido. Cinco grupos de artistas foram contemplados, com apoio financeiro de R$ 29 mil no total. Nesta semana, o coletivo Mucha Tinta finaliza os desenhos em grafite no terminal do Cabral e a artista plástica Juliana Burigo começa sua intervenção no terminal do Campo Comprido.
Quando iniciou os grandes desenhos em cores fortes no Cabral, o artista Celestino Dimas (Mucha Tinta), que fez o trabalho em conjunto com Jorge Galvão e coordenação de Giusy de Luca, logo pensou em deixar alguns espaços vagos nas paredes, já que imaginava que surgiriam intervenções de terceiros. "Deixamos alguns espaços porque pensamos que pudesse ter alguma pichação em cima, e nossa proposta era dialogar com elas. Mas isso não aconteceu", diz Dimas. Para ele, a atitude demonstra que os passageiros receberam bem a intervenção. "Pretendemos entender se as pessoas gostam que o artista vá até elas".
O coletivo convidou também o designer e amigo Fred Freire para registrar imagens dos desenhos feitos durante a madrugada, e colher depoimentos dos artistas e da população sobre a experiência. O registro, realizado de maneira espontânea e sem roteiro, vai virar um curta-metragem, que deve ser lançado depois do carnaval. Como contrapartida social, o Mucha Tinta propôs um tour pela cidade em uma linha de ônibus (ainda não definida), para mostrar ao público as intervenções e grafites no trajeto, além de falar sobre os conceitos e referências usados nos desenhos da galeria subterrânea. O passeio será para interessados, e os horários e dias (por enquanto sem data fechada), serão divulgados no terminal do Cabral.
Contemporânea
Com um trabalho que utiliza e necessita de amplos espaços, a artista plástica Juliana Burigo define a galeria subterrânea do terminal do Campo Comprido, onde inicia sua intervenção na noite de hoje, como um espaço ideal. Ao contrário das obras do Cabral, a proposta de Juliana é fazer apenas dois desenhos em linhas amplas, que se relacionam entre si. "Vai mexer mais fisicamente com as pessoas, que terão a impressão de passar dentro dele", explica. A utilização da cor magenta, segundo a artista, vai ajudar a tirar o amarelado do local. "A sujeira e os rabiscos ficarão menos evidentes com a luminosidade da cor".
Conservação
Segundo o coordenador de Artes Visuais da FCC, Roberto Alves, a responsabilidade pela conservação dos trabalhos é dos artistas, levando em conta as peculiaridades do espaço, como a grande circulação de pessoas. "Intervenções artísticas no ambiente urbano têm características diferentes de trabalhos que fazem parte de acervos ou estão expostos em museus. Nesses locais, temos o controle da temperatura, segurança e incidência da luz, por exemplo. Nos terminais a situação é diferente. O espaço não é expositivo. Há um cuidado, mas o desgaste natural existe".
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