As biografias são apenas a ponta. Ao puxá-la, a ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, parece ter encontrado um iceberg bem maior do que aparentava ser a exigência de liberações prévias para publicações de livros biográficos. Por quase cinco horas, dezessete líderes de associações representadas por jornalistas, produtores de cinema, escritores, pesquisadores, professores, políticos e advogados defenderam, na última quinta-feira, em Brasília, suas ideias sobre o que uns chamam de censura e outros de autorização prévia.

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A audiência pública pedida pela ministra serviu para abastecer o Supremo de informações sobre o assunto antes que ele seja colocado em pauta para a votação de uma Ação de Inconstitucionalidade (Adin) movida pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL). Cármen Lúcia prometeu entregar suas conclusões ao presidente da Casa, Joaquim Barbosa, até o dia 14 de dezembro, o que possibilitaria a realização da votação ainda neste ano, já que o recesso será a partir do dia 20 de dezembro

A juíza não recebeu expositores com interesses particulares na questão para evitar a particularização do assunto. Conseguiu com isso dois efeitos. O bom: despolarizou o debate que vinha sendo feito até então entre biógrafos, editores de livros e artistas potencialmente biografáveis. E o ruim: ao não aceitar a presença de nenhum biografado ou representante da Associação Procure Saber, formada por Chico Buarque, Caetano e Gilberto Gil, presidiu um debate por vezes sem equilíbrio. Dos 17 expositores, apenas dois falaram pela necessidade da autorização prévia: o deputado federal Marcos Rogério (PDT-RO) e o advogado da Associação Eduardo Banks, Ralph Lichote.

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A escritora Ana Maria Machado falou em nome da Academia Brasileira de Letras. Acusou primeiro as tentativas de censura e alertou para um argumento que voltaria a ser visitado: "Outro grave risco é a instalação da censura à imprensa. As redações dos artigos [que preveem a autorização prévia] não falam apenas de biografias".

O momento mais constrangedor da audiência foi protagonizado por Ralph Lichote, da Associação Eduardo Banks. "Imagine se, às vésperas de uma eleição, aparece a biografia de um político dizendo que ele fez sei lá o que em uma festa na faculdade. A pessoa tem de ser avaliada pelo que se tornou. Não vale dizer que o cara foi um cheirador lá atrás."