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Gramado (RS) – Com uma programação de filmes sem muita expressão, a expectativa era grande quanto à apresentação de Deserto Feliz, do diretor pernambucano Paulo Caldas, na última terça-feira, terceiro dia da mostra competitiva do Festival de Cinema de Gramado 2007. Passada a projeção, a produção dividiu as opiniões da crítica presente ao evento gaúcho. Alguns embarcaram na proposta de cinema do diretor, outros a acharam pura viagem estética.

Ao lado de Lírio Ferreira, Caldas realizou, em 1996, um dos principais filmes da chamada retomada do cinema brasileiro: Baile Perfumado. Lançado em meio à efervescência do movimento manguebeat, a fita apresentava a história do fotógrafo que registrou imagens do cangaceiro Lampião e seu bando, nos anos 30.

A produção se destacava pelas seqüências e planos cinematográficos elaborados e ousados, e também pelas trilha sonora com nomes como Chico Science & Nação Zumbi e mundo livre s/a. Em 2000, Caldas dividiu com Marcelo Luna a direção do bom documentário O Rap do Pequeno Príncipe contra as Almas Sebosas.

Dessa forma, o primeiro vôo-solo do cineasta pernambucano em longas-metragens era muito aguardado, ainda mais porque Deserto Feliz anunciava no elenco os atores do elogiado Cinema, Aspirinas e Urubus, João Miguel, Peter Ketnath e Hermila Guedes (esta também estrela de O Céu de Suely).

O filme foi selecionado para a mostra Panorama do Festival de Berlim 2007, mas teve recepção fria por parte do público local e da crítica internacional. A história é centrada em Jéssica (a estreante Nash Laila), adolescente de 15 anos, moradora do interior de Pernambuco, que encontra no turismo sexual (comum no Nordeste do Brasil) uma forma de se sustentar. Depois de algum tempo, ela encontra o alemão Mark (Ketnath) e vai com ele para Berlim.

Assim como Baile Perfumado, Deserto Feliz começa com ótimas seqüências de planos. O filme vai passando e novas imagens – todas registradas com câmera na mão, uma mais elaborada que a outra, com efeitos preparados milimetricamente – vão enchendo a tela. E dá-lhe closes, super-closes, imagens desfocadas ou estouradas, câmera em pontos inusitados, travellings, planos-seqüências. A sensação é de um exercício exagerado de virtuosismo, pouco visto no cinema nacional atual.

Em depoimento no debate sobre Deserto Feliz no Festival de Gramado, realizado ontem pela manhã, o diretor confirmou que sua intenção era fugir dos padrões e das regras rígidas que, segundo ele, predominam no cinema de ficção. "Elas fazem o espectador ficar viciado, esperando o docinho na boca, não o que faz pensar", comentou. "Mas ir contra esse método é um processo perigoso", reconhece.

Caldas conta que a participação de alguns coadjuvantes foi sendo aos poucos cortada, para dar mais ênfase à história de Jéssica. Mas isso fez com que a fita tivesse pouquíssimos diálogos e muitos silêncios, uma trama pouco trabalhada. "O espectador deve construir o filme na sua cabeça, criar ele mesmo o envolvimento com o personagem. Por isso, a aposta no lado psicológico da história, no silêncio, no plano-seqüência", revela o produtor Germano Coelho Filho.

Sem diálogo

A postura e as explicações dos realizadores de Deserto Feliz valem uma reflexão. Não é preciso entregar tudo de bandeja para o espectador, mas também não se pode ir ao extremo de não lhe dar nada, uma ponte sequer para que se envolva com história e personagens, como acontece no filme pernambucano, em que a estética prevalece sobre o roteiro – belo mas vazio. E essa característica tem sido uma constante no cinema brasileiro recente – mesmo fitas elogiadas como os citados Cinema, Aspirinas e Urubus e O Céu de Suely, não dialogam tanto com o grande público.

No biênio 2002-03, a produção nacional conseguiu a expressiva marca de 22% de participação nos bilhetes vendidos nos cinemas do Brasil, com filmes de grande alcance como Carandiru, Cidade de Deus, Os Normais, Lisbela e o Prisioneiro, etc. Mas esse bom momento não teve continuidade, pois, nos últimos anos, escassearam as produções mais populares e aumentaram o número de títulos feitos praticamente para cinéfilos (tanto aqui como no exterior) – outros, não raros, parecem ser realizados apenas para deleite do próprio diretor e parceiros de projetos.

Depois, os cineastas reclamam que o público só quer ver filmes como Primo Basílio, que foi um verdadeiro sucesso de bilheteria em sua abertura, no último fim de semana. Não é preciso ir ao extremo na tentativa de agradar, como faz Daniel Filho com seu melodrama, mas os diretores brasileiros poderiam mostrar um pouco mais de interesse em dialogar com o espectador do país. O repórter viajou a convite do festival.

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