A banda Tiregrito nasceu há cerca de cinco anos, em Francisco Beltrão. Começou como quarteto de “country rock”, tocando coisas como Johnny Cash e Creedence Clearwater Revival – linha comum de se ver por aí. Até que, por força da gaita de Vinícius Urbano, acordeonista tarimbado nos CTGs que marcam a cultura da região, os shows mudaram.
Conforme o músico foi se integrando ao grupo, “Jambalayo”, do Creedence, ganhou companhia de “João Balaio”, do nativista Mano Lima; “Cotton-Eyed Joe”, canção country do folclore norte-americano, foi emendada com “Milonga para as Missões”, de Borghettinho. E AC/DC passou a dividir as festas com Cesar Oliveira & Rogério Melo.
“Foi um processo natural. Com a entrada dele, começamos a enveredar para essa pegada tradicionalista. Começamos a ter mais contato com essa música, e ele com o rock-and-roll”, conta o vocalista Rafael Barzotto, que forma a Tiregrito ao lado de Rodrigo Tártari (baixo), Marco Tesser Pereira (guitarra) e Jhonatan Trindade Picini (bateria), além de Urbano.
Guia
Entenda o que a banda beltronense quer dizer quando fala:
“Chute no balde”
Que é sensacional, espetacular: “Que chute no balde este estúdio!”
“Torar o pau”
Beber e festejar, se divertir muito: “Desce mais uma gelada gurizada/ que agora o pau vai torá” (da música “Chumbo Grosso e Copo Largo”, do EP “Sul do Mundo”)
“Diabaria”
Esbórnia, farra: “Fim de semana é diabaria e tiroteio/ Cheque frio do Banestado ao bodegueiro” (da música homônima)
“Tiro e grito e cheque frio”
Estroinice: “Ontem foi tiro e grito e cheque frio”
“Quebracostela”
Abraço: “Um quebracostela bem apertado”
“Moer na bocha”
Inspirada no jogo de bocha 48, popular em Francisco Beltrão, significa destacar-se positivamente: “Este cara está moendo na bocha!”
“Galismo”
Influenciada pela rinha de galo, que era comum na região, significa um ato admirável, empenho, façanha: “Aquele ali é galo!”
“Mazá”
Contração de “mas que barbaridade”
“Percebemos que a música tradicionalista gaúcha e o rock-and-roll e o blues bebem da mesma fonte. As batidas e linhas de baixo de Johnny Cash também estão presentes em muitas músicas de artistas como o Teixeirinha, Os Serranos e outras que ouvimos no sul do Brasil. Costumamos dizer que Teixeirinha é o Johnny Cash brasileiro”, brinca.
Cultura beltronense
Junto com a música tradicionalista do Rio Grande do Sul, a banda resolveu incorporar outros elementos que marcam a identidade cultural de Francisco Beltrão e região. Por exemplo, usou gírias locais (confira o guia ao lado) nas letras e assumiu o lado mais rural da cidade, povoada por cerca de 85 mil habitantes, de acordo com a última contagem. E batizou o “rock tradicionalista” que faz com brincadeiras como “roque colono”.
“Falar daqui, da gente daqui e da nossa cultura acabou servindo como inspiração para as nossas músicas”, conta Barzotto. “Esse jeito estranho de falar , com o erre carregado, a gente não disfarça. Fazemos questão de bater no peito e falar que nossa cultura é assim”, conta.
De acordo com o músico, o termo “colono”, considerado pejorativo em outros contextos, não é problema para o povo beltronense, que chegou ao local vindo do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina a partir dos anos 1940. “A colonização da região Sudoeste é forte e foi muito marcada por lutas, como a Revolta de 1957 [Revolta dos Posseiros]”, explica. “O pessoal aqui tem orgulho de ser colono.”
O EP “Sul do Mundo”, primeiro disco do grupo, saiu em março deste ano, e faz várias referências a este universo em meio a uma sonoridade que remete a várias vertentes do rock (a faixa-título tem participação de Mutant Cox, da banda curitibana de country alternativo Hillbilly Rawhide) .
No dia 10 de agosto, a Tiregrito participou de um concurso promovido por uma montadora de veículos que oferecia uma oportunidade de tocar em um dos palcos do Rock in Rio – “a cidade do segundo Cristo Redentor mais famoso do mundo”, conforme publicou o grupo, em referência ao Cristo beltronense localizado no Bairro da Cango. Não rolou, mas o grupo só chegou à final depois de amealhar quase 20 mil votos na primeira fase, engajando a comunidade beltronense por meio de apresentações na rua e em escolas.
“Sul do Mundo”
Ouça o EP do Tiregrito, “Sul do Mundo”, disponível no site da banda.
A ideia é “erguer a bandeira do Sudoeste para além das fronteiras dos [rios] Marrecas e Chopim”. Mas, de acordo com Barzotto, a intenção é continuar com as raízes fincadas na região – manifesto presente também em “Sul do Mundo”, que diz: “Eu viajei por toda parte/Mas [a] nenhuma que me agrade como lá”.
“Sempre se teve a impressão de que, pra se dar bem, tem que ir pra Curitiba. A gente não acredita”, diz. “A gente gosta de morar no Sudoeste.”
Assista ao clipe da música “Gato Preto”:
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