2-5499 Ocupado, novela que estreou há exatos 50 anos, poderia ter se perdido no tempo. Mas a trama, do argentino Alberto Migré e adaptada para a TV Excelsior por Dulce Santucci, marcou por ser a primeira com exibição diária no Brasil, sedimentando um hábito que dura até hoje.
A obra, também a primeira a reunir o casal-símbolo Tarcísio Meira e Glória Menezes, era inicialmente exibida três vezes por semana. Pouco mais de um mês após a estreia, a TV Excelsior decidiu colocá-la no ar de segunda a sexta-feira.
A atriz Lolita Rodrigues, que participou de 2-5499 Ocupado (título que aludia a um dos números de telefone da emissora) e fazia a antagonista de Glória, lembra que poucos no meio acreditavam que uma novela diária pudesse dar certo. Isso devido a questões de logística e à precariedade de estúdios. "Fazíamos a novela no Teatro Cultura Artística [alugado pela Excelsior para gravações]. A gente esperava a tevê fazer os programas e gravávamos a noite inteira, até de manhã. Tínhamos de esperar a montagem e desmontagem de cenários. Era muito desgastante."
Na visão da atriz, o brasileiro comprou imediatamente a ideia de uma novela diária. O doutor em teledramaturgia pela USP Mauro Alencar concorda e ressalta que, apesar de ter apenas 42 capítulos, 2-5499 Ocupado conseguiu consolidar elementos do formato que ainda persistem. "Além do par romântico, estabeleceu a estrutura narrativa dos ganchos no final de cada capítulo, como já se fazia em Cuba e na Argentina."
Transformação
Os folhetins diários se transformaram ao longo das décadas. As produções ficaram mais caras, com o aumento do número de personagens, locações e a sofisticação do aparato cenográfico. Na opinião do autor da Rede Globo Manoel Carlos, as mudanças de conteúdo foram pontuais, mas houve avanços tecnológicos. "O arsenal de recursos que temos à disposição para criar e executar programas de ficção e jornalismo nos permite dar asas à imaginação de maneira quase ilimitada", afirma.
Os romances açucarados ainda existem, mas passaram a dividir espaço com críticas políticas e temáticas sociais. Segundo Alencar, esse é um aspecto que diferencia a trajetória da telenovela brasileira das demais na América Latina. "A censura na tevê foi muito mais branda aqui. Na Argentina, Colômbia e Chile, a censura invadiu as emissoras e calou a voz dos autores. Já no Brasil, a tevê abarcou dramaturgos que não podiam falar no teatro", explica. Nem por isso ficaram livres de cortes. Roque Santeiro, de Dias Gomes, que seria exibida em 1975, foi suspensa depois que 30 capítulos já estavam prontos.
Próximos desafios
Para Lauro César Muniz, outro autor cuja obra é marcada pela abordagem de temas políticos, as produções atuais perderam a contundência. "Pensaram [as emissoras] que era preciso fazer trabalhos de gosto mais popular. Ultrapassamos o limite das concessões. A novela chegou a um nível baixíssimo, com abuso de clichês e maniqueísmos", critica. Outra reivindicação de Muniz, hoje na Rede Record, é que se encurte o tamanho das tramas, que chegam a ultrapassar 200 capítulos. "Seriam necessários menos colaboradores e o estilo do autor apareceria mais. A busca de originalidade não existe mais, tornou-se um processo industrial", defende.
As séries americanas e a internet, vistos como concorrentes na disputa pela audiência, podem ajudar na manutenção do sucesso do formato. "A novela também tem a característica de absorver outros gêneros. Nos anos 1960, se falava que a novela deveria assimilar a linguagem do cinema e do teatro. Agora, fala-se nas séries e na internet. A narrativa é mais acelerada, com conflitos que se resolvem em poucos capítulos, influenciada pelos produtos norte-americanos", explica Alencar.
As emissoras apostam em novas abordagens para a manutenção do formato. Avenida Brasil, sucesso de audiência de João Emanuel Carneiro em 2012, bateu novo recorde quase dez meses depois de seu capítulo final. Com direitos de exibição adquiridos em 106 países, já é a obra da Globo mais licenciada no exterior.
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