A restauração de uma monarquia merovíngia descendente de Jesus, a conversão do imperador Constantino, os Cavaleiros Templários e o misterioso Priorado de Sião são tópicos que normalmente seriam reservados a discussões acadêmicas.
Nas duas últimas semanas, porém, esses e outros temas misteriosos da história ou do folclore da antiguidade e Idade Média ganharam atualidade num julgamento fascinante envolvendo direitos autorais que, nesta segunda-feira, ingressou em sua terceira e possivelmente última semana.
O milionário escritor Dan Brown, cujo livro "O Código Da Vinci" um dos romances mais lidos de todos os tempos, tendo vendido cerca de 40 milhões de exemplares, é acusado de plágio de uma obra de contexto histórico escrita em 1982.
Os historiadores Michael Baigent e Richard Leigh estão processando a editora britânica de Dan Brown por violação de direitos autorais, embora seja a mesma editora, Random House, que publica o livro deles, "The Holy Blood, and the Holy Grail" ("O Santo Graal e a Linhagem Sagrada", publicado no Brasil pela ed. Nova Fronteira).
O sucesso fenomenal da obra de Brown levou as vendas de "The Holy Blood" a aumentar nos últimos anos, e o próprio julgamento as multiplicou por sete na Grã-Bretanha.
Dezenas de jornalistas de todo o mundo vêm acompanhando cada virada do processo e brincam, dizendo farejar uma teoria conspiratória digna do próprio "Código Da Vinci".
Como ambos os livros provavelmente vão se beneficiar da publicidade, poderia a própria Random House estar por trás do processo? A editora nega.
"Como editora tanto de 'O Código Da Vinci' quanto de 'The Holy Blood and the Holy Grail', lamentamos o fato de dois dos três autores de 'The Holy Blood' terem optado por abrir este processo litigioso contra nós", afirmou a editora em comunicado.
Seriam necessárias muitas vendas de livros para cobrir as custas do processo, que especialistas estimam em mais de 1 milhão de libras (US$ 1,75 milhão).
Os personagens principais da polêmica revelam alguns contrastes curiosos.
Durante mais de três dias da semana passada, Michael Baigent, que fala em tom polido, usa terno e tem ar de professor universitário, foi interrogado de maneira implacável pelo advogado da Random House, John Baldwin, sobre até que ponto "The Holy Blood" e "O Código Da Vinci" de fato se sobrepoem.
Em vários momentos ele foi obrigado a retroceder em relação a afirmações específicas feitas por ele e Leigh e a abrandar o tom de seu depoimento, que se estendeu por 146 páginas.
Na sexta-feira, foi a vez de Leigh depor, e ele imediatamente partiu para o ataque, acusando Dan Brown de roubar suas idéias e Baldwin de agir com descortesia.
Durante sua passagem muito mais breve pelo banco das testemunhas, Leigh foi interrogado sobre a originalidade de sua própria obra, publicada em 1982.
Dan Brown acompanhou a maior parte dos procedimentos na primeira fileira dos bancos reservados ao público, aparentando calma e ocasionalmente conversando com seu advogado ou passando um bilhete para algum integrante da equipe da Random House.
O autor de 41 anos evita estar ao centro das atenções, mas ter que se acostumar a isso nesta segunda-feira, quando será interrogado pelo advogado dos autores da ação, Jonathan Rayner James.
Mas até agora o astro do julgamento tem sido o juiz Peter Smith, que consegue abrir caminho em meio a argumentos legais labirínticos com clareza e brevidade, além de injetar doses de humor nos procedimentos.
Quando ele afaga seu bigode volumoso e faz observações calmas, o tribunal lotado faz silêncio, ansioso por ouvir cada palavra.
Na semana passada, quando Leigh reclamou que Dan Brown deu crédito insuficiente a ele e seus co-autores por suas pesquisas, Smith o lembrou que "The Holy Blood" foi mencionado no romance - um dos personagens tem um nome que um anagrama de "Baigent" e "Leigh".
Leigh respondeu que isso não bastava. Mas, nesse momento, o caso todo parecia estar se resumindo à simples solicitação de um agradecimento.
- Se Dan Brown tivesse reconhecido a contribuição de 'The Holy Blood and the Holy Grail' na abertura de seu livro, duvido que estaríamos aqui - disse Leigh.
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