Conscientização
Faixa turística estimula mudança de comportamento
André Gonçalves, correspondente
DivulgaçãoDar o "sinal de vida" antes de atravessar está virando hábito
Na frente da janela da minha casa (onde agora escrevo este texto), há uma faixa de pedestres. Costumo utilizá-la como um ponto turístico da cidade. Cada visita que recebo de Curitiba passa pela experiência de atravessar a rua fazendo os carros pararem sem a necessidade de sinaleiro ou guardinha de trânsito.
Como toda atração para forasteiros, porém, conviver diariamente com a faixa não é lá tão fácil assim. De poucos em poucos minutos escuto o barulho de freadas, buzinas e, ao abrir a cortina, vejo alguém a pé fazendo gestos sacanas para os motoristas. Há respeito, mas os automóveis continuam sendo quem manda.
A história do respeito à faixa em Brasília começou em 1996. Com o crescimento no número de atropelamentos, o jornal Correio Braziliense encabeçou uma campanha de conscientização no trânsito que teve como ápice uma passeata com 25 mil pessoas no centro da capital. Era algo bem trivial, que tinha como símbolo uma mão espalmada que simbolizava a paz.
Deu certo. Ou melhor, vem dando certo. Afinal, é o tipo de iniciativa que não muda a cabeça das pessoas do dia para a noite.
Há três anos, o governo do Distrito Federal recomeçou um trabalho para tentar retomar o espírito original da faixa. "Dê sinal de vida", diz a propaganda oficial. Antes a ideia se pautava no conceito de que o motorista precisava tomar a iniciativa de cuidado com o pedestre agora passou a ser o contrário.
A instrução é para as pessoas estenderem o braço sinalizando a entrada na faixa. O problema é que os motoristas usam isso como desculpa para tocar o carro em cima de quem já está visivelmente atravessando a rua, mas não fez o tal "sinal de vida". Ponto para o lado mais forte.
Apesar disso, é justo dar o crédito para os brasilienses. Dezesseis anos são relativamente pouco tempo para um processo de mudança de costume que, queira ou não, é bem mais avançado do que em outras cidades do país. Eles são a prova de que civilidade é uma lição difícil, que só se aprende com uma longa prática.
A lógica inversa das ruas
Sem nenhum aparato de proteção, quem anda a pé nas ruas das grandes cidades do Brasil não é visto como o mais frágil, e precisa se virar sozinho para se resguardar
Curitiba ganhou, há 40 anos, uma via exclusiva para pedestres formada por várias quadras da XV de Novembro. Foi uma decisão ousada de não priorizar os carros que chamou a atenção do Brasil todo. Uma nova via nos moldes da conhecida Rua das Flores deve estar na cidade até 2014, com a revitalização da Avenida Cândido de Abreu, no Centro Cívico. O calçadão, que irá da Praça 19 de Dezembro até a sede da prefeitura, terá cerca de 950 metros de extensão por 18 de largura, e faz parte do PAC da Copa. A previsão inicial era de que a obra fosse iniciada no segundo semestre do ano passado, o que ainda não ocorreu. Segundo a assessoria de imprensa da Prefeitura Municipal, a licitação deve ser realizada em outubro, e a construção começará em janeiro do ano que vem.
O arquiteto, assessor de planejamento do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) e responsável pelo projeto, Reginaldo Reinert, tem uma relação passional com a região: nasceu no Centro Cívico e acredita que, de carro, é muito mais difícil apreciar os monumentos que simbolizam a cidade e que estão por ali, como o Palácio Iguaçu e a imagem da padroeira, Nossa Senhora da Luz dos Pinhais. "A busca é devolver ou pelo menos apresentar para a população essa importância simbólica. Também é uma ideia antiga estender as vias para pedestres que nascem na XV e passam pelo setor histórico."
Para quem pensa que os carros serão excluídos, Reinert logo argumenta: a via ganhará mais pistas já que, hoje, duas ruas naquele trecho acabam subaproveitadas, servindo quase como um estacionamento. "Sobrará para o calçadão e para as faixas de carro, sendo que uma delas, no sentido catedral, será exclusiva para ônibus. Facilitará a vida de todo mundo, gerando menos conflito no trânsito e circulação melhor do pedestre." O arquiteto explica que uma das linhas de arborização será mantida, e outra precisará ser retirada. Entretanto, está inclusa no projeto a colocação de arborização móvel, que pode ser tirada temporariamente quando a avenida vira palco de desfiles, como o de 7 de Setembro, por exemplo.
Com o apelo do Museu Oscar Niemeyer (MON), Reinert torce para que alguns pontos tradicionais de Curitiba, como a feira dominical no Largo da Ordem, se estenda para o novo calçadão. "Você estará ligando não só esses equipamentos de cultura, mas também o Passeio Público e o Bosque do Papa. São dois parques no centro da cidade ligados por um calçadão. Isso é privilegiadíssimo. Será um ganho que ficará evidente, sobretudo nos fins de semana." Reinert conta também que uma proposta foi feita aos empresários do Shopping Mueller para que a praça de alimentação ficasse no primeiro pavimento, integrando-a com a nova calçada, mas a sugestão ainda não se transformou em um plano. O projeto tem até, segundo o arquiteto, uma "licença poética". O piso tátil para deficientes visuais, em vermelho, seria o desenho de uma pomba, criada por Poty Lazzarotto. Porém, por conta da legislação que rege os parâmetros de acessibilidade, ainda não se sabe se a ideia poderá ser colocada em prática.
Caminhando
Melhorar a percepção do que é a cidade, se apropriar do centro e conhecer melhor o lugar onde se vive são algumas vantagens apontadas por Reginaldo Reinert na criação de vias exclusivas para pedestres. "A partir do momento que a XV surgiu, as pessoas passaram a passear no centro, e não enxergá-lo como um local que funciona somente para resolver problemas. Isso fez diferença para o cidadão." Ele cita exemplos de outras ruas "inteligentes" de Curitiba, como a Senador Alencar Guimarães, também no eixo central, que tem calçadão de pedestres e espaço para carros. "É uma rua de todos. Ali ninguém avança a velocidade, pois sabe que não pode, é uma convivência pacífica."
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