Há pouco mais de dois meses, quando o cantor e compositor Zeca Baleiro se apresentou no Curitiba Center Art, uma fã entusiasmada chamou especial atenção do maranhense. "Era uma senhora de cabelos brancos, de mais de 70 anos, que estava muito perto do palco e cantava algumas das músicas, do princípio ao fim. Foi emocionante", conta o músico.
Considerado um dos expoentes da chamada nova música popular brasileira, surgida na década passada, Baleiro tem o que pode ser definido como "apelo transgeracional". Basta conferir um de seus shows para perceber que o público do artista é eclético: vai de adolescentes a gente de meia-idade, que pode ou não estar acompanhada dos filhos.
A explicação para esse fenômeno pode estar no fato de Zeca ter assumidas influências que vão do cearense Fagner que partilha com Zeca as origens sírio-libanesas a Charlie Brown Jr., banda santista da qual gravou o hit "Proibida pra Mim". Também passa, é claro, pelo trovador e poeta norte-americano Bob Dylan, de quem pode ter herdado o gosto por letras verborrágicas, cheias de figuras de linguagem e metáforas, que mal cabem nas melodias. Exemplo disso é seu ultra-elaborado penúltimo disco-solo, Pet Shop Mundo Cão (2003), no qual Baleiro se apropria das mais diversas referências musicais, do rap ao pagode, e solta, como nunca, seu verbo.
Mas há algo de diferente no horizonte de Baleiro. Pelo menos, por ora. Baladas do Asfalto & Outros Blues, novo CD do maranhense, produzido por Walter Costa e Dunga, traz letras contidas e enxutas mas não menos ricas de imagens. O diferencial significativo, entretanto, talvez seja o caráter mais introspectivo e pessoal das letras, que se ocupam menos do mundo ao redor, dos paradoxos da contemporaneidade, tema recorrente na obra do músico. E os arranjos, por sua vez, o colocam mais próximo da seara do rock-and-roll. Uma mudança de ventos, como o próprio artista admite.
"Versos Perdidos", a possante e eletrificada faixa de abertura, é um bom exemplo dessa fase, digamos, ensimesmada de Zeca Baleiro: "As frases são minhas/ as verdades são tuas/ enquanto te desejo/ me vejo chorando no meio da rua". A instrospecção segue na canção seguinte, "Balada do Asfalto" (que dá título ao álbum): "Me dá um beijo meu amor/ se eu vejo o mundo com meus olhos/ me dê um beijo meu amor/ hoje eu tenho cem anos/ e meu coração bate como um pandeiro.
Um dos pontos altos do CD, que já figura entre os melhores do artista, é a balada "Cigarro". A canção o traz de volta ao universo do também ótimo Líricas (2000). Com um pungente e vigoroso arranjo de cordas, a faixa embute ecos do clássico pop "Por Isso Eu Corro Demais" (de Roberto e Erasmo Carlos), dizendo: "A solidão é meu cigarro/ não sou de nada e nem sou de ninguém/ eu entro no meu carro e corro/ corro demais só para ter ver meu bem". GGGG
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