Espaço
Casa Daros
(R. General Severiano, 159, Botafogo Rio de Janeiro), (21) 2138-0850. Visitação de quarta-feira a sábado, do meio-dia às 20 horas, e nos domingos e feriados, do meio-dia às 18 horas. Até o dia 14 de abril, a entrada será gratuita. Mais informações em www.casadaros.net.
Após mais de cinco anos em um ambicioso projeto de restauro, a Casa Daros abriu suas portas para o público pela primeira vez neste fim de semana, trazendo uma programação que inclui oficinas, cursos, conversas com artistas e exposições. Concebida como um espaço de interação entre artistas da América Latina, a casa surge com a promessa de ser um importante ponto de encontro dos novos nomes que despontam no cenário cultural latino-americano. A exposição inaugural, Cantos Cuentos Colombianos, traz 75 obras emblemáticas de dez artistas colombianos contemporâneos.
O visitante que chegar ao espaço vai se deparar com uma provocativa obra de Fernando Arias. O artista construiu um caixão em tamanho natural com peças de Lego nas cores da bandeira colombiana. É o sonho infantil se transformando num jogo da morte no lugar da cruz, uma linha branca simboliza a cocaína. A alusão à droga é recorrente na mostra. Juan Manuel Echavarría a transforma no produto final do hino nacional colombiano em "Bandeja de Bolívar". E Miguel Ángel Rojas faz desenhos a partir de colagens de folhas de coca e notas de dólares dilaceradas.
Há também trabalhos que mostram as contradições de um país com uma exuberância natural que colide com a realidade social, como a instalação "Musa Paradisíaca" (nome científico da banana), de José Alejandro Restrepo. Já María Fernanda Cardoso remove a natureza de seu contexto e apresenta esculturas feitas de cadáveres de lagartos, moscas e gafanhotos.
E Nadín Ospina foi buscar inspiração nas esculturas pré-colombianas para discutir a questão da identidade. As peças em pedra, cerâmica ou metal fundido são versões modificadas produzidas a partir de modelos originais, onde a cabeça das esculturas é substituída por personagens de Walt Disney e de outros ícones da cultura pop norte-americana. Minnie se transforma em uma deusa da fertilidade e Pateta, em um xamã.
"Queremos obras que sejam capazes de produzir algo na mente e na memória do visitante", afirma o curador Hans-Michael Herzog. Os trabalhos, que estarão em exposição até o dia 8 de setembro, fazem parte da Coleção Daros Latinamerica, um rico acervo de quase 1,7 mil obras representativas de 117 artistas nascidos ou que vivem na América Latina. A coleção foi criada em 2000 pela bilionária suíça Ruth Schmidheiny, e traz um abrangente panorama da produção cultural nas Américas.
"Não compramos obras para comprar o nome do artista. Não podemos ter uma coleção enciclopédica. O interesse é pela qualidade intrínseca da obra", afirma Herzog, que é também diretor artístico da coleção. Toda a reserva técnica é mantida em Zurique, e o foco no Brasil são as exposições e os programas educacionais.
Para o diretor de arte e educação da Casa Daros, Eugenio Valdés Figueroa, a ideia é criar um centro de divulgação na América Latina que funcione também como um espaço para os artistas se encontrarem e conhecerem suas produções. "Vivemos um período em que todos falam pelo artista: o curador, o crítico de arte. Então queríamos criar um espaço para devolver esse protagonismo ao criador, divulgar sua voz e seu pensamento", diz Figueroa.
Escolha
Uma série de fatores levou o Rio de Janeiro a ser escolhido como a sede da Casa Daros. A ideia inicial era levar o projeto para Havana, mas as negociações fracassaram em 2003 por questões internas do governo cubano. Os idealizadores descartaram o México por estar muito próximo dos Estados Unidos, e outras cidades latino-americanas foram preteridas por enfrentarem momentos de instabilidade. São Paulo e Buenos Aires, na época, já possuíam uma infraestrutura cultural bastante consolidada. O Rio despontava como um cenário promissor.
O local escolhido foi o edifício neoclássico projetado por Francisco Joaquim Bethencourt da Silva, discípulo de Grandjean de Montigny. Inaugurado em 1866, o prédio de mais de onze mil metros quadrados no bairro de Botafogo, com um grande pátio interno e um jardim frontal de palmeiras imperiais, pertenceu à Santa Casa de Misericórdia durante quase 150 anos. O edifício, tombado desde a década de 1980, abrigou um orfanato para meninas e um educandário antes de ser vendido em 2006. As obras de restauro começaram no ano seguinte, dirigidas por Paulo Mendes da Rocha e depois por Ernani Freire.
"Fomos aprendendo que a casa demandava mais tempo do que imaginávamos", diz Isabella Rosado Nunes, diretora geral da Casa Daros. Os R$ 16 milhões usados na aquisição do imóvel e os outros R$ 67 milhões do projeto de recuperação, além dos custos de manutenção do espaço, estão sendo investidos integralmente pela família Schmidheiny. Não há qualquer outra fonte de recurso, como financiamento, parcerias ou leis de incentivo. "Mas não estamos fechados a isso", ressalta Isabella.