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O muralista

• Tão determinante na biografia de Frida quanto o sofrimento físico, foi a conturbada paixão pelo muralista mexicano Diego Rivera.

• "Diego está na minha urina, na minha boca, no meu coração, na minha loucura, no meu sono, nas paisagens, na comida, no metal, na doença, na imaginação’’, escreveu certa vez.

• Juntos, apesar de brigas e traições, eles levaram uma vida política e cultural intensas, recebendo Leon Trotsky em sua casa e estabelecendo amizades entre os surrealistas e com Pablo Picasso.

• "De Rivera, na convivência mais estreita, Frida herda o ambiente intelectual e conhecimentos técnicos (Rivera era um mestre da pintura), mais do que qualquer influência de conteúdo artístico ou definição de forma", observa a crítica de arte Maria José Justino.

Vida e obra poucas vezes foram tão indissolúveis quanto na trajetória de Frida Kahlo. A mais admirada das pintoras mexicanas, morta em 1954, completaria 100 anos na próxima sexta-feita (dia 6). A pintura para ela era sobrevivência. Pois, foi justamente por seus auto-retratos que Frida conquistou a permanência e o reconhecimento internacional.

Na comemoração do seu centenário, a "fridomania" tomou conta da Cidade do México e bateu todos os recordes de visitação com a exposição Frida Kahlo 1907 – 2007. Cuba rende-lhe homenagens a partir do fim da semana. No Brasil, a celebração se dá pelo lançamento de uma seleção de correspondências da artista, agrupadas por Martha Zamora no livro Cartas Apaixonadas de Frida Kahlo (Editora José Olympio, 160 páginas, R$ 30).

Se obra e vida caminham juntas, nada mais adequado do que, às vésperas da data, relembrar a relevância tanto da artista quanto da mulher. "Seu valor artístico está em sua pesquisa poética desligada do cubismo, mas, assim mesmo, afirmativa de uma certa modernidade", observa o crítico de arte Paulo Reis, que destaca ainda a alta carga de subjetividade na obra da pintora. "Sua obra, sem dúvida, mantém independência absoluta não apenas das estéticas e da moral, mas igualmente de outros artistas e escolas. É uma pintura solitária", comenta a crítica de arte Maria José Justino.

É comum a obra de Frida Kahlo (e sua constante sensação de pesadelo) ser associada ao surrealismo – o que foi dito inclusive pelo escritor surrealista André Breton, com que ela conviveu. Mas a própria pintora nega o enquadramento. "Acreditavam que eu era surrealista, mas não era. Nunca pintei meus sonhos. Pintei minha própria realidade", disse.

Segundo Maria José Justino, a pintura de Frida se situa entre a cultura mexicana, "primitiva e religiosa", herdada da mãe; e a alemã, "introspectiva e meditativa", legada pelo pai. "Essas influências, somadas à tragicidade da sua vida, levaram-na, sem escolha, a uma pintura fascinada pela morte e pela dor", afirma a crítica.

Pelvis rompida, coluna fraturada, dores dos pés ao pescoço. O acidente que dilacera o corpo da jovem aos 18 anos é tão determinante de seu futuro pessoal quanto artístico, é a tragédia que a faz pintar. "Agora, vivo num planeta dolorido, transparente como gelo. É como se houvesse aprendido tudo de uma vez, numa questão de segundos", escreveria a mexicana sobre o momento em que o ônibus em que estava colidiu com outro veículo e uma barra de ferro trespassou-lhe o corpo.

A história e suas conseqüências são conhecidas. A garota enfrentou cirurgias, períodos imobilizada em sua cama, mais tarde, teve três gravidez interrompidas e uma perna amputada até a altura do joelho. Na ocasião de mais essa perda, anotou em seu diário: "Pés, para que os quero, se tenho asas para voar?".

Feminista

Na opinião do crítico de arte Fernando Bini, o maior legado que Frida Kahlo deixou é para as lutas femininas na América Latina. "Antes de todos os movimentos feministas, ela já põe em questão o papel da mulher", diz. Contra a corrente, Bini considera a pintura de Frida relevante apenas no contexto mexicano e atribui a maior importância dada a ela no cenário mundial do que às mexicanas Maria Izquierdo e Remedios Varo, que considera mais representativas, ao fato de que Frida sempre esteve mais em evidência enquanto personagem histórico.

Gerar alguma polêmica é o mínimo que se poderia esperar de uma mulher de personalidade forte como foi Frida Kahlo. Como escreveu a crítica de cinema Maria Silvia Camargo, quando do lançamento do filme em que Salma Hayek interpretou a pintora (Frida, de Julie Taymor), é "difícil saber se o mundo ama o sofrimento de Frida Kahlo ou a arte de Frida Kahlo". Na impossibilidade de separá-los, seu prestígio aumenta, o valor de suas obras cresce no mercado artístico e Frida se aproxima de se tornar um mito.

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