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Disco duplo em 2014? Quarteto ousa e brinca consigo mesmo | Arnaldo Belotto/ Divulgação
Disco duplo em 2014? Quarteto ousa e brinca consigo mesmo| Foto: Arnaldo Belotto/ Divulgação

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Crucificados Pelo Sistema Bruto

O disco está disponível para download em www.charmechulo.com.br

Eles chutaram o balde. Sabe-se que o Charme Chulo é aquela banda estranhazinha, a começar pelo nome, aliteração debochada. A base fundadora de seu som é o que sairia do encontro entre Johnny Marr e Tião Carreiro e Pardinho num churrasco de domingo. O vocalista, Igor Filus, tem trejeitos erráticos e cativantes. Mas agora, ao completar dez anos de estrada, a banda curitibana roda a baiana de vez e lança hoje um álbum duplo acachapante.

Crucificados Pelo Sistema Bruto é uma espécie de retorno triunfal de um grupo que quase ficou pelo caminho. O Charme Chulo foi-se para São Paulo em 2009. "Tivemos que mudar para continuar", diz o guitarrista Leandro Delmonico. Não deu certo. A banda voltou para Curitiba no ano seguinte, e "precisava de um disco." Pararam de tocar para compor – por isso o sumiço. Ano passado, lançaram o single "Coisas Desesperadoras do Rock and Roll", em que emulavam uma estética glam. E agora, o resultado de toda essa história: 20 músicas e um álbum que te tira do lugar.

"É isso. Na era da efemeridade, resolvemos lançar um disco duplo. Mas nossa preocupação não é ser popular, é agradar aos fãs," diz Delmonico. Crucificados Pelo Sistema Bruto – o nome é uma corruptela "crítica" de Crucificados Pelo Sistema (1984), álbum do Ratos de Porão – é um verdadeiro sacolão de referências, críticas, piadas, ironias e pequenas loucuras.

"É um disco como trajeto. Falamos de viver de rock no Brasil, mas fazemos ironia com a própria banda. Nos apropriamos de vez do trash e fizemos algumas metamúsicas", diz o guitarrista. O álbum foi gravado no estúdio Click, em Curitiba, e contou com a colaboração de Rodrigo Lemos, principalmente nas "programações eletrônicas." Pois é. Hudson Antunes gravou os baixos. E Douglas Vicente, a bateria. Nos metais, Lauro Ribeiro.

Indie & sanfona

O nome da banda surgiu numa noitada no James Bar, em Curitiba. "Naquele tempo em que a gente ia ouvir Pulp e Suede e se sentia o máximo", lembra Delmonico. "Mas aí nós saíamos de manhã e tinha um senhor tocando sanfona na rua, tinha um axé na esquina. Não dá para ser indie em Curitiba", atesta. Crucificados... pode ser entendido, então, como uma vontade de emprestar certa sofisticação ao rock. E não conseguir. "Há uma indústria extremamente cruel que te massacra, que produz música ruim em série e não deixa nunca o rock chegar. Agora tem a [banda] Malta, que não é rock porque não incomoda. Se não assusta a sua avó, não é rock", filosofa Delmonico, que "às vezes se sente como um cantor de lanchonete."

A grande sacada da banda foi criticar o "sistema bruto" sem aquele engajamento fajuto que quase sempre soa anacrônico – pense em Dinho Ouro Preto com um nariz de palhaço. Charme Chulo, ao contrário, ri de si mesmo, e reflete a sua condição perante um mundo musical contaminado. "Não temos mais um Chacrinha. Não temos mais a mesma coragem dos anos 1980. Nos achamos modernetes, mas somos uns bundões", diz o músico, que teme por quem não conhece o Charme Chulo e irá ouvir o disco pela primeira vez.

Faixa a faixa

De música de Oktoberfest a um miniépico. Saiba mais sobre as faixas de Crucificados pelo Sistema Bruto:

Disco 1

1. Palhaço de Rodeio

Serta-rock sobre um quase peão desiludido. Repare no solo de guitarra ao melhor estilo Gian & Giovani.

2. Ninguém Mandou Nascer Jacu

Pancadão pop. Na letra, os playboys da Batel e o motel My Garden.

3. Fuzarca

Com participação de Helio Flanders, do Vanguart, é um folk rock em alta velocidade.

4. É Que Às Vezes (É Melhor Morar na Fazenda)

Breve tratado sobre a opressão da cidade grande. Lembra a faceta country do Primal Scream.

5. Eita!

Vinheta hilária. Um cantor de lanchonete, apenas (e tudo) isso.

6. Dia de Matar Porco

De repente, o Charme Chulo se transmuta em uma bandinha da Oktoberfest. Copos quebram, salsichas são veneradas. Porcos morrem. O final é apoteótico (e engraçado demais).

7. Levante o Vestido

Teclados e breguices sobre uma "rapidinha." Música com potencial para fazer sucesso no Gato Preto.

8. Com o Diabo no Corpo

Hard rock para não se ouvir na igreja.

9. Bruta Alegria

Axé! Sim, axé, com "ôôs" e "êás" e aplausos em fade.

10. Caipirinha

Reggae com viola caipira. "Stanhéguer" na letra. O Charme Chulo chega perto do Pantanal, mas fala sobre pegar jacaré na Praia de Leste.

Disco 2

1. Meu Peito é Um Caminhão Desgovernado

"O rock anda frouxo demais", canta Igor. Neste pequeno épico, uma moda de viola se transforma num rock progressivo instrumental. No meio de tudo, um diálogo de beira de estrada. E uma autorreferência: citação à "Polaca Azeda", música do primeiro disco da banda.

2. Vinho de Mesa

Viola. Música instrumental para um fim de tarde.

3. Quem Vai Carpir o Lote?

Um rock clássico sobre aparências.

4. Coisas Desesperadoras do Rock and Roll

Single lançado ano passado, é uma música vigorosa e bem-humorada.

5. Novos Ricos

"Lalalalalalalalalala­".

6. Carcaça Sensacional

O Charme Chulo encontra Dalton Trevisan numa música que poderia ser do Vampire Weekend. Ou do Estradasphere.

7. Karaoke

Faixa esquecida do primeiro disco dos Smiths (brincadeira).

8. Vale a Pena Morrer pelo Protesto

O Charme Chulo visita a Idade Média (e o Dream Theater, de leve) para falar sobre a salvação da humanidade.

9. A Viola foi Pro Saco

Um modão.

10. Multi Stillus

Música para o dia em que o New Order visitar o Passeio Público. É a mais inusitada do álbum.

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