"Setembro de 98, o que será que eu sentia? Hoje, quatro anos depois, não deixei de amá-la, mas o amor que sinto se afirma no vazio de uma dor que lateja. O silêncio, o desdém, a falta de atenção, tudo se avoluma dentro de mim quando penso em Suellen e todas essas lembranças maceradas superam, em forma e força, a do que foi o nosso namoro. Pensei em procurá-la mais uma vez, depois de tantas tentativas de reatamento, de apostas na vontade de, ainda mais uma vez, tentar convencê-la, simplesmente da nossa existência.
Meu peito é um vulcão extinto. É como me sinto depois que nos separamos, eu lhe disse certa vez. Como se algo tivesse se extinguido, eu disse a ela quando, depois de meses que não nos víamos, trocamos palavras protocolares num encontro casual, até que me saí com essa, Meu peito é um vulcão extinto, ao que ela respondeu com seu silêncio habitual.
Não sei de onde me veio, mas a frase, bastante melodramática, admito, me ocorreu em resposta à pergunta Como você está?, que ela me dirigiu, levando a mão ao meu peito."
Trecho do romance Corpo a Corpo com o Concreto, de Bruno Zeni. É possível ler mais fragmentos da obra no blog corpoconcreto.blogspot.com.
Curitiba, para Bruno Zeni, hoje com 34 anos, tem gosto de infância. Ele nasceu e viveu na capital paranaense até 1989. Basta uma mordida em um folhado de doce de leite, da Confeitaria das Família, para Zeni recuperar, pela memória, muitas cenas e sensações de seus primeiros anos de vida. Mas, rapidamente, com a mesma velocidade com que retorna ao passado, ele está de volta com os dois pés no tempo presente.
E presente, para Zeni, é a cidade de São Paulo.
O efeito que a maior metrópole brasileira provocou no curitibano pode ser entendido nas linhas e entrelinhas de Corpo a Corpo com o Concreto, romance contemplado com uma bolsa da Petrobras, de R$ 30 mil.
Zeni mora em uma casa na Pompéia, nas imediações da Vila Madalena, bairro que atrai artistas, boêmios e estudantes. Mas ele não é de sair à noite. O escritor afirma que São Paulo não é um local propício ao ócio. Ao contrário. Lá, há tantas oportunidades, convites e ofertas de emprego que não é possível se dar ao luxo de não fazer nada.
Ano passado, ele participou da equipe que moveu a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Apesar de ter gostado (muito) da experiência, não vai repetir a dose. Ele é doutorando em Letras na Universidade de São Paulo (USP). Precisa de tempo livre para ler dezenas de obras e dar corpo à tese que vai escrever sobre João Antônio (1937-1996), autor do clássico Malagueta, Perus e Bacanaço.
Zeni, lenta mas definitivamente, parece se afastar do jornalismo. Ele é jornalista. Trabalhou entre 1998 e 2000 na revista Cult, depois migrou para a redação da Folha de S.Paulo e, atualmente, trabalha para o mercado editorial. Motivos para a mudança de área? "Nada em especial", despista. Hoje, ele presta serviços para a Companhia das Letras e também faz freelancers para uma empresa espanhola.
Ele já pensou em se mudar para o Rio de Janeiro, mas sabe que é São Paulo quem "paga" as suas contas. O escritor conta que mesmo que, hipoteticamente, viesse a ganhar muito dinheiro, e não tivesse mais a necessidade de trabalhar, continuaria fazendo trabalhos temporários de vez em quando. "Para estar em sintonia com a praticidade da vida, apesar de que meu sonho é morar na Bahia. Mas é só um desejo", afirma.
Zeni acorda cedo e, no embalo da esposa, que sai de casa por volta das 8 horas, ele também pula da cama. Quando pode, cuida do seu jardim. Mas todo dia, faça chuva ou sol, ele lê trechos dos sete, oito livros que precisa comentar no Guia da Folha, compromisso mensal e fonte de renda.
Em algum momento do ano, ele escapa de São Paulo e retorna à terra natal. Ao visitar o Paraná, ele fica em São José dos Pinhais, cidade onde o seu pai vive atualmente. E Curitiba? "Curitiba faz parte do meu imaginário. Curitiba está em mim, como lembrança, esteja eu onde estiver", finaliza Zeni.
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