“A Pele de Vênus”, de Roman Polanski, fala de sedução, mas não daquela sensual. O filme, a melhor estreia nos cinemas desta semana, mostra exatamente como funciona o jogo sedutor que faz funcionar o cinema, o teatro, a ficção. É uma sedução intelectual que almeja o convencimento.
A história abre com um passeio de câmera por uma avenida linda, provavelmente em Paris, até encontrar um teatro meio decadente, mas ainda charmoso (essa sequência é um pouco estranha, parece gerada por computador).
A câmera entra no teatro e descansa na frente de um homem ao telefone que conversa com alguém sobre chegar a tempo para o jantar. O nome dele é Thomas, um diretor teatral cansado depois de um dia inteiro tentando encontrar uma atriz para sua peça. E frustrado porque não encontrou nenhuma.
Chove do lado de fora (um detalhe que esqueci de mencionar antes) e, no instante em que Thomas pega o casaco e se prepara para ir embora, Vanda entra em cena.
Ela está atrasada para os testes que terminaram há um tempo. É uma mulher madura, vestida de maneira sensual, um pouco atrapalhada e nervosa, que masca chiclete.
Thomas se desculpa e tenta explicar para Vanda que os testes para o papel de Vanda (primeira bandeira vermelha que o filme acena: a atriz e a personagem na peça dentro do filme têm o mesmo nome) acabaram. Thomas escreveu uma adaptação para o texto clássico de Leopold von Sacher-Masoch (1836–1895), o austríaco que inspirou um médico alemão a cunhar o termo “masoquismo”.
De qualquer forma, ele não quer saber de atrizes que mascam chicletes, mas Vanda não desiste. Ela gastou um dinheirinho num figurino de época, vai abrindo a mala, pegando o vestido, falando pelos cotovelos.
Estreia
“A Pele de Vênus” teve pré-estreia na semana passada e entra em cartaz nesta quinta-feira (24), no Espaço Itaú e no Cineplex Batel. Confira os horários no Guia.
Mesmo contrariado, Thomas parece um sujeito bom (ele é interpretado por Mathieu Amalric, um baita ator francês, que fez o sujeito imóvel em “O Escafandro e a Borboleta”). Ele tenta ser ríspido, mas não consegue simplesmente enxotar a atriz do teatro (vivida pela mulher de Polanski, Emmanuelle Seigner, que também trabalhou em “Escafandro...”, no papel da ex-mulher do sujeito imóvel).
Quando Vanda começa a fazer uma cena da peça, algo surpreendente acontece. Ela não mais parece nervosa e coitadinha. O que Thomas vê é uma mulher que está no comando de suas emoções e, mais importante, que domina o texto da peça como nenhuma outra candidata daquele dia.
E imagine que descrevi só os primeiros 15 minutos de filme.
O formato de “A Pele de Vênus” se parece com o de “Deus da Carnificina” (2011), o filme anterior do mesmo Roman Polanski: poucos atores, um único ambiente, diálogos espetaculares. É o que você pode chamar de filme “teatral”, mas existe muito cinema ali.
O esquema pode funcionar mais ou menos assim: Thomas não dá nada por Vanda no começo da história e, poucos minutos depois, não consegue tirar os olhos dela. Você pode achar que o filme é pequeno demais, “teatral” demais, e não dar nada por ele, mas vai acabar seduzido.
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