No tocante ao conteúdo, não existe lá muita diferença entre o humor sexual grosseiro e a vulgaridade onipresente de “Papai Noel às Avessas 2”, que entrou em cartaz no mês passado, e “A Última Ressaca do Ano”, que entrou em cartaz esta semana nos EUA. Os dois filmes são comédias de temática natalina, cujo humor funciona à base de violência pastelão, muitas vezes com golpes baixos, sacanagem, abuso de drogas e uma linguagem chula e mordaz, todas as características padrão do mundo moderno da comédia de censura 18 anos.
Há, porém, uma grande diferença entre esses dois presentes que apareceram debaixo das árvores de Natal dos cinemas do país, que é a forma como eles se apresentam. Enquanto “Papai Noel às Avessas 2” nos oferece o mesmo conteúdo difícil de digerir envolvido num pacote perfunctório, que parece ser sido embrulhado às pressas, num jornal velho usado anteriormente para forrar gaiola, “A Última Ressaca do Ano” surge todo arrumadinho num papel brilhoso e um lacinho bonitinho.
O mau gosto é o mesmo, mas ele parece ter sido feito por duendes felizes – e muitíssimo safados – e não por uma fábrica de trabalhadores mal humorados. Os duendes, nesse caso, são os codiretores Josh Gordon e Will Speck, de “Escorregando para a Glória”, que têm nas mãos um roteiro hilário cheio de piadas sujas, escrito por Justin Malen, Laura Solon e Dan Mazer.
A maior parte do sucesso do filme, no entanto, deriva do comprometimento brilhante de um elenco grande e talentoso, que inclui Jason Bateman, Olivia Munn, T. J. Miller, Courtney B. Vance, Kate McKinnon, Rob Corddry, Vanessa Bayer, Randall Park, Jillian Bell e Jennifer Aniston, que aqui nos dá uma versão um pouco mais vulgar e muito menos sensual da personagem tipo queridinha-da-América-que-deu-errado que ela interpretou nos filmes da série “Quero Matar Meu Chefe”. Aqui, no papel de Carol Vanstone, o Grinch do filme, ela é a matriarca de uma firma de tecnologia nacional na qual paira a ameaça de demissões em massa no dia da festa de Natal da filial em Chicago, cuja única salvação será se o chefe de tecnologia (Bateman) e o gerente da filial (Miller) – também, por acaso, irmão de Carol, uma figura ao mesmo tempo burrinha e gentil – conseguirem conquistar um novo cliente em potencial (Vance).
Nisso entra a festa, que Carol queria cancelar, mas que agora assume um novo nível de urgência, visto que é o único recurso de que a firma pode dispor para seduzir o cliente. Que tipo de festa é essa, exatamente? Do tipo que serve gemada numa estátua de gelo com o formato de um gnomo priápico e inclui uma máquina de neve artificial que, por acidente, lança na cara do personagem de Vance uma bela rajada de cocaína, trazida pela prostituta (Abbey Lee) que foi contratada por um funcionário de TI solitário (Karan Soni) para fingir ser sua namorada.
O filme também ajuda muito para esquecer os seus próprios problemas, contanto que você deixe o bom gosto, o bom senso e o decoro do lado de fora antes de entrar
Sim, é bem esse o tipo da festa. O que quer dizer: cheia de estereótipos fáceis e piadas bobas, muitas das quais são feitas com uma alegria tão inconsequente que acaba, de algum modo, fazendo com que elas sejam menos ofensivas do que deveriam ser e tenham toda a graça que você permitir que elas tenham (para mim, o nível de acidez do humor do filme, do tipo que gosta abertamente de tentar causar nojo na plateia, foi um tônico muito bem vindo para a vulgaridade venenosa – porém muito mais séria – das eleições recentes. Mas pode ter sido só comigo).
Em outras palavras, “A Última Ressaca do Ano” é um convite para o tipo de escapismo que apaga a mente e a consciência e que existe de verdade apenas no cinema. Mas esse nível aguçado de irrealidade só serve para que Bateman tenha ainda mais oportunidades para acessar o seu saco sem fundo de humor sardônico e Miller – junto com todo seu elenco de bobos da corte coadjuvantes – faça papel de palhaço.
O filme também ajuda muito para esquecer os seus próprios problemas, contanto que você deixe o bom gosto, o bom senso e o decoro do lado de fora antes de entrar.
GG
*Nascido e criado em Washington, D.C., Michael O’Sullivan vem trabalhando desde 1993 no The Washington Post, onde faz cobertura de matérias sobre arte, cinema e outras formas de cultura popular e impopular.
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