Woody Allen é um dos raros cineastas americanos atuais que trabalham em vários níveis. Em seus melhores filmes, ao menos. E “Café Society” é um dos grandes Woody Allen deste século, talvez o melhor.
Ali o jovem judeu (sempre há um) é Bobby (Jesse Eisenberg), sai do Bronx, Nova York, direto para Hollywood, disposto a trabalhar com o tio Phil (Steve Carell), poderoso agente de cinema. Do mundo mais que real ao mundo dos sonhos.
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Estamos entre os anos 30 e 40 do século passado. Jake detesta o ambiente hollywoodiano, com estrelas, frescuras, exibicionismos, excentricidades e tal. Mas também sonhará: com Vonnie (Kristen Stewart), a secretária do tio, que o leva para conhecer a cidade e também tem uma queda por ele. Há, porém, um namorado secreto na jogada.
Para resumir, Bobby volta para Nova York, onde gerenciará o night club do irmão. Sim, entram aí dois elementos centrais do filme: um é o café society que frequenta o lugar: artistas, nobres, milionários, gângsteres.
Gângsteres como o irmão de Bobby. E eis aí apresentado mais um elemento tão próprio de Allen e tão presente no filme: a família judia de Nova York, com seus personagens sempre bem diferentes entre si, os pais que vivem aos berros, a eterna busca de uma reafirmação do próprio judaísmo.
Até agora, como vimos, não entrou nenhum intelectual na história. Entrará um, mas será bem secundário desta vez (será também o comunista). Passemos.
O que Woody faz aqui é articular os vários níveis da sua narrativa: um aspecto da história americana do século passado (a América dos anos 1930/40, na costa leste ou oeste), com seus usos e costumes e, sobretudo, música; a família judia com vasta diversidade (cada membro é de um jeito: há os bem-sucedidos e os fracassados, os ricos e os pobres, os gângsteres e a gente de bem), aproximada apenas pelos hábitos comuns.
Acima de tudo, esses aspectos conduzem ao lado romântico da trama. O lado triângulo amoroso, sempre caro ao autor. Pois entre a insegurança do amor pelo ainda pobretão Bobby e a segurança que lhe oferece o namorado secreto, Vonnie optará por este último.
Como em “Casablanca”, o clássico de 1942 e uma referência na obra de Allen (ver “Sonhos de um Sedutor”, de 1972), temos aí uma mulher que ama dois homens igualmente, porém de formas diferentes. Aqui, cabe à mulher escolher.
Woody não discute as razões de Vonnie, trabalha sobre a simples dor da escolha, que implica, sempre, renúncia.
O setor romântico será o mais evidente desta comédia dramática, o mais desenvolvido também. Aquele que cola todas as outras partes. Aquele ao qual Woody retorna de tempos em tempos sempre apaixonadamente: o amor entre o dever e o prazer. Ou entre a segurança e a incerteza do futuro, tanto faz: afinal, são variantes de “Casablanca”.
E aquele que serve para confirmar o carisma enorme de Stewart e Carell e a eficácia seca de Eisenberg, num conjunto invulgar em que também cai como uma luva a luz de Vittorio Storaro.
Um filme em que Allen retorna a ideias que conhecemos bem, mas que parecem estar lá pela primeira vez. Em suma: um filme muito acima de quase tudo que se tem visto recentemente e uma confirmação de Woody Allen como um dos principais cineastas americanos da atualidade.
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