O Dalai Lama, que prega incansavelmente a paz interior enquanto repreende as pessoas por sua vida materialista e egoísta, encomendou aos cientistas uma missão sublime: ajudar a transformar o público laico em humanos mais compassivos e autoconscientes. Certamente não se trata de uma tarefa fácil. Então o Dalai Lama pediu algo com um nome grandioso para acompanhar suas ambições igualmente grandiosas: um abrangente Atlas das Emoções para ajudar as mais de sete bilhões de pessoas no planeta a lidar com o lamaçal de seus sentimentos para obter paz e felicidade.
“É meu dever publicar essa obra”, declara o Dalai Lama.
Para criar o que chamou de “mapa da mente”, ele procurou uma fonte que Hollywood tem usado para investigar os mecanismos internos da psique humana. Especificamente, encomendou ao seu bom amigo Paul Ekman – psicólogo que trabalhou como consultor dos criadores de “Divertida Mente”, da Pixar, longa-metragem animado ambientado dentro da cabeça de uma garota – um mapeamento da vastidão dos sentimentos humanos. Posteriormente, Ekman os destilou nas cinco emoções básicas descritas no filme, da raiva à alegria.
A filha de Ekman, Eve, igualmente psicóloga, também trabalhou no projeto, com a meta de produzir um guia interativo das emoções humanas que qualquer pessoa com acesso à internet pudesse estudar na busca pela autocompreensão, calma e ação construtiva.
“Por natureza ou biologicamente, temos uma emoção destrutiva e, também, construtiva. Essa interioridade, as pessoas deveriam prestar maior atenção nela, do jardim de infância à universidade. Não é só pelo conhecimento, mas para criar um ser humano feliz. Família feliz, comunidade feliz e, por fim, humanidade feliz.”
“Por natureza ou biologicamente, temos uma emoção destrutiva e, também, construtiva. Essa interioridade, as pessoas deveriam prestar maior atenção nela, do jardim de infância à universidade. Não é só pelo conhecimento, mas para criar um ser humano feliz. Família feliz, comunidade feliz e, por fim, humanidade feliz”, diz o Dalai Lama.
O Dalai Lama pagou a Ekman pelo menos US$ 750 mil para desenvolver o projeto, que começou com um pedido vários anos atrás.
“Quando quisemos chegar ao Novo Mundo, precisamos de um mapa”, disse Ekman citando o Dalai Lama. “Assim, faça um mapa das emoções para podermos chegar a um estado calmo”, ele pediu.
Como primeiro passo, Ekman conduziu uma pesquisa com 149 cientistas (estudiosos da emoção, neurocientistas e psicólogos que são os principais autores em seus campos de atuação) para ver onde havia consenso sobre a natureza das emoções, os humores ou estados que produzem, e áreas relacionadas.
Baseado na pesquisa, Ekman concluiu existir cinco amplas categorias de emoções – raiva, medo, nojo, tristeza e alegria – e que cada uma tinha um subconjunto elaborado de estados emocionais, gatilhos, ações e humores. Então, levou essas descobertas a uma empresa de cartografia e visualização de dados, a Stamen, para descrevê-las de forma visual e, com sorte, útil.
“Se não for divertido será um fracasso. É preciso ser divertido para as pessoas usarem”, afirma Ekman.
O fundador da Stamen, Eric Rodenbeck, criou visualizações de dados para o Google, o Facebook e a MTV, além de mapas mostrando a mudança climática e o aumento do nível dos oceanos; contudo, disse que este foi o projeto mais desafiador no qual trabalhou porque era “construído em torno do conhecimento e da sabedoria e não de dados”.
Sem surpresa, fazer os cientistas chegarem a uma compreensão unificada das emoções humanas foi difícil.
Dacher Keltner, professor de psicologia da Universidade da Califórnia, campus de Berkeley, também orientou a Pixar na definição e descrição dos personagens emocionais de “Divertida Mente”. Ele também foi consultor do Facebook em seus emoticons.
Embora Keltner tenha participado da pesquisa de Ekman, os dois não concordam plenamente no número das emoções fundamentais. Para Keltner, os achados do Atlas têm erros, mas ele vê o projeto com bons olhos.
“As perguntas da pesquisa poderiam ter permitido mais áreas indefinidas, mas é importante avaliar qual é o consenso científico na área”, avalia.
Ekman enfatiza que o Atlas não é uma obra científica destinada à revisão de especialistas.
“Não se trata de um projeto científico. É uma visualização do que achamos que aprendemos com os estudos científicos. É um processo transformativo, uma obra de explicação.”
Quer seja um projeto científico ou uma ferramenta para a iluminação pessoal, o Dalai Lama não quer misturar com religião.
“Se encararmos essa pesquisa como se valendo de crença religiosa ou tradição, então ela automaticamente se torna limitada. Mesmo que você reze para Deus, para Buda, emocionalmente, muito legal, muito bom, mas cada problema é criado por nós. Então creio que nem Deus nem Buda podem fazer muita coisa.”
O Dalai Lama diz ter esperança de que o Atlas possa ser uma ferramenta para cultivar o bem no mundo ao derrotar o mal dentro de nós.
“No fim das contas, nossa emoção é a verdadeira causa dos problemas. Nós temos de conhecer a natureza desse inimigo.”
O Dalai Lama conta que foi encorajado pela reação ao projeto do presidente Barack Obama quando lhe falou a esse respeito na Índia.
“Obama parece, creio eu, mostrar mais interesse em nosso valor interior. No passado, a compaixão era uma espécie de sinal de fraqueza ou a raiva um sinal de poder, de força. A natureza humana básica é mais compassiva. Essa é a base real da nossa esperança.”
Embora empolgado com o Atlas, o Dalai Lama, 80 anos, provavelmente não ficará clicando pelo site interativo. Ele se sente muito mais confortável virando as páginas impressas de uma versão feita especialmente para o líder.
“A tecnologia é para o meu próximo corpo”, ele gracejou uma vez para os pesquisadores.
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