Dentro de uma tradição que remonta às origens de Hollywood e à sua Era de Ouro, Taylor Sheridan é a principal força criativa por trás de “A Qualquer Custo”, em cartaz desde quinta-feira (02) nos cinemas. Indicado ao Oscar de roteiro original pelo filme, Sheridan se inspirou em um parente para escrever esse faroeste moderno sobre dois irmãos que roubam bancos em pequenas cidades do Texas e são perseguidos por um velho policial federal às vésperas da aposentadoria.
Chris Pine, o capitão Kirk dos mais recentes “Star Trek”, e Ben Foster interpretam os irmãos, e Jeff Bridges faz o papel do veterano Marcus. Por sua interpretação, Bridges mereceu uma indicação à estatueta de melhor ator coadjuvante. Em 2010 ele levou o prêmio de ator por “Coração Louco”. As outras duas indicações para “A Qualquer Custo” são de melhor filme e melhor edição.
“Foi um tio meu, Parnell McNamara, que inspirou o personagem de Marcus. Ele era delegado no Texas e foi obrigado a se aposentar aos 57 anos. Achei interessante a ideia do seu propósito de vida tirado de você ainda muito cedo. Essa foi uma das minhas motivações. A outra foi que essa região do Texas tinha um modo de vida que se sustentou por 130 anos e está morrendo. A economia está muito ruim e arruinou as pessoas que vivem lá, inclusive membros da minha família. Como resultado, houve um êxodo daquela região. Daí essa ideia de morte de um modo de vida. Para instituirmos um modo de vida, outro foi destruído. E esse ciclo é interessante como forma de mostrar quem somos como povo”, afirma Sheridan.
Entre os protagonistas há ainda a figura de Alberto, personagem do ator americano de origem indígena Gil Birmingham. O ranger acompanha Marcus em suas investigações sobre os ladrões de bancos e aguenta piadas racistas e discriminatórias do amigo. Ele tem, diz o roteirista, um entendimento mais amplo do que ocorre naquela região do Texas, justamente porque seu povo também teve um modo de vida destruído e teve que assimilar uma nova forma de existir no mundo.
“Conheço muitos nativos americanos e sou bem familiarizado com o sistema de reservas indígenas nos Estados Unidos. O personagem de Alberto tem um entendimento muito acurado dessa assimilação porque ele descende de um povo que foi assimilado. Ele tem a capacidade de enxergar o que a maior parte das pessoas naquela região não consegue perceber, porque são descendentes daqueles que promoveram essa assimilação”, defende o roteirista.
“Eu não elegi Trump! Meu pensamento sobre as eleições é o seguinte: um monte de gente desesperada em busca de políticos de carreira para escolher algum que achem que melhor os representa. Não sei se é o caso, mas acho que votaram mais contra Hillary do que a favor de Trump.”
Assim como os irmãos Toby (Pine) e Tanner (Foster), Marcus e Alberto também são faces opostas de uma mesma moeda. Essa oposição representa, na visão de Sheridan, a dificuldade dos homens de expressarem suas emoções.
“São duas relações muito frágeis entre homens que não sabem como se expressar um para o outro. E mesmo assim estão ligados por afeição e propósitos comuns. Essa falha na comunicação é a ruína desses laços.”
Além da paisagem desolada do Texas e da crise que afeta a população, outro “personagem” recorrente no filme são as armas. Presentes em quase todas as sequências, seja na mão de bandidos e policiais ou de cidadãos comuns, elas fazem parte da cultura local. Apesar das críticas e dos elogios ao modo como foram colocadas na narrativa, o roteirista disse que tentou não julgar, mas apenas destacar esse aspecto daquela realidade.
“Pode-se argumentar que se trata de um filme que apoia a posse e o porte de armas, e pode-se argumentar que se trata de um filme que critica a posse e o porte de armas. Como roteirista, não tomo partido. Deixo isso para o público. Mas certamente mostro as armas sendo usadas de um modo muito ruim, na falta de um termo melhor. Os dois irmãos estão usando armas ilegalmente para cometer crimes. Agora, elas são usadas por cidadãos comuns para tentar impedi-los de cometer esses crimes. A despeito da opinião que se tenha, ninguém discute o potencial destrutivo das armas. São máquinas refinadas e muito bem desenhadas para fazer uma coisa específica, e essa coisa é matar. E elas fazem isso muito bem - avalia ele.
Sheridan poderia assinar a direção do filme se quisesse. Em vez disso, preferiu destinar a cadeira criativa mais importante da produção a David Mackenzie, depois que Peter Berg (, o cineasta que havia escolhido originalmente para a função, abandonou a produção para assumir outros compromissos. O trabalho de Mackenzie, segundo o roteirista e produtor, não poderia ter sido melhor.
“Foi uma decisão coletiva apontá-lo como diretor. Ele é um autêntico contador de histórias e diretor. Fez exatamente o que eu imaginava, um trabalho miraculoso.”
“Quando eu decidi deixar de atuar foi porque estava cansado de contar as histórias dos outros e queria contar as minhas próprias. Queria falar do mundo da maneira como eu o vejo”
Oriundo de uma bem-sucedida carreira de ator, com participações dignas de nota em séries como “Sons of anarchy”, “CSI” e “Veronica Mars”, Sheridan abandonou a atuação porque queria contar suas próprias histórias:
“Quando eu decidi deixar de atuar foi porque estava cansado de contar as histórias dos outros e queria contar as minhas próprias. Queria falar do mundo da maneira como eu o vejo”, diz ele, que ri quando questionado sobre se sua decisão foi motivada pela qualidade dos roteiros. “Isso tem mais a ver com o “como’ eu decidi e não tanto com o “por quê”. Apenas queria contar as minhas histórias.”
Sobre a eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos, Sheridan avalia que significou mais uma rejeição à candidata do partido Democrata, Hillary Clinton, do que uma aprovação ao empresário convertido em político:
“Eu não elegi Trump! Meu pensamento sobre as eleições é o seguinte: um monte de gente desesperada em busca de políticos de carreira para escolher algum que achem que melhor os representa. Não sei se é o caso, mas acho que votaram mais contra Hillary do que a favor de Trump. Como resultado de ter escrito esse roteiro não sou mais um membro da classe média baixa. Tenho o luxo de não ter que votar pela minha sobrevivência. Trump disse, durante a campanha, coisas duras e fortes que eram para atingir a população no estômago. Esse país precisa de cura, e não sei se ele pode trazer isso. Temos de ter esperança, porque não há nada que possamos fazer para “deselegê-lo”.”