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Operadoras de telefonia móvel conseguiram na Justiça suspender  repasse de verba para produção audiovisual | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Operadoras de telefonia móvel conseguiram na Justiça suspender repasse de verba para produção audiovisual| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

De um lado, a indústria da telefonia móvel, que conquistou na Justiça o direito de suspender o Condecine, verba repassada ao governo para abastecer a produção do audiovisual brasileiro, alega alta carga tributária e o inevitável repasse desses custos ao consumidor, que já “não suporta mais” pagar tantos impostos. De outro, a Agência Nacional de Cinema (Ancine) e uma série de entidades que dependem desse dinheiro (cerca de R$ 1 bilhão por ano) para produzir filmes, documentários, séries de TV e web, elencam os méritos do audiovisual brasileiro nas bilheterias e em prêmios internacionais. Some a isso uma lista de quase 150 artistas, repudiando a ação movida pelas teles, por meio do SindiTelebrasil, sindicato patronal da Telebrasil, associação de empresas de telefonia móvel.

Personagens de bastidores, siglas e legislações de um cenário que o público não vê a olho nu colocam agora o cidadão comum no centro de uma disputa judicial que pode retardar o crescimento da produção audiovisual no País. Vale tudo para mobilizar a opinião pública, desde ameaças de aumento de impostos e retração dos serviços de telefonia móvel ao orgulho de ver o seu país em uma disputa ao Oscar - “O Menino e o Mundo”, finalista do ano em Animação, tem sido o cartaz exibido pela Ancine sobre o bom uso dos recursos provenientes do Condecine.

A Ancine e a Advocacia Geral da União estão recorrendo na Justiça contra a liminar concedida ao SindiTelebrasil pelo juiz Itagiba Catta Preta Neto, na 4ª Vara de Brasília. Há urgência no andamento do caso, já que o depósito deste ano para o setor do audiovisual estava previsto para ocorrer em 31 de março. Disso depende o andamento, ou retardamento, da produção audiovisual para os próximos anos, visto que os projetos são planejados para longos prazos. A Telebrasil é formada por empresas como Vivo/Telefônica, Claro, Tim, Oi e outras.

Embora boa parte da lista de artistas e diretores, produtores e roteiristas que endossam o abaixo-assinado repudiando a ação da SindiTelebrasil sobreviva de serviços prestados à Globo, a maioria está envolvida em trabalhos que usufruem do Condecine. Ali estão nomes como Fernanda Montenegro, Adriana Esteves, Cauã Reymond, Dira Paes, Fábio Porchat, Glória Pires, Leandro Hassum, Lázaro Ramos, Marieta Severo, Miguel Falabella, Patrícia Pillar, Rodrigo Santoro, Wagner Moura, Guel Arraes, Alê Abreu, Cao Hamburger, Cacá Diegues, Fernando Meirelles, Hector Babenco e Walter Lima Jr., entre outros.

“A solidificação do setor audiovisual brasileiro resultou em grandes e crescentes índices de bilheteria no cinema e a previsão de 2016 como seu melhor ano em todos os tempos”, diz o texto, endossado ainda por entidades como a Associação Brasileira de Produtoras Independentes (ABPITV). “No mercado internacional, o audiovisual conquistou maior prestígio, como a indicação de uma animação nacional ao Oscar, as recentes premiações de séries brasileiras no Emmy, além dos três filmes selecionados no Festival de Berlim.”

Paralelamente às operações nos tribunais, Telebrasil e entidades representativas do audiovisual também têm dialogado. Há uma conta a ser equacionada nessa questão: segundo a Telebrasil, apenas 47% da verba do Condecine tem de fato sido usada na produção do audiovisual. E, embora apoiem as iniciativas da Ancine, muitos produtores se queixam da morosidade na avaliação e repasse do dinheiro em projetos aprovados.

Em comunicados à imprensa, a Telebrasil diz que “não se justifica que as prestadoras de serviços de telecomunicações recolham uma contribuição destinada ao fomento da indústria audiovisual.” As teles, no entanto, concordaram em pagar essa taxa em 2010, por ocasião da aprovação da lei 12.485, que regulamenta o setor de TV paga. Em troca, elas ganhariam lugar nessa festa, passando também a operar a distribuição de pacotes de TV por assinatura - até então, Vivo, Oi e Claro não tinham espaço nesse negócio.

Ocorre que o Condecine, que não deveria representar aumento de carga tributária para as teles, ganhou mais peso no cofre das empresas de telefonia, que agora aproveitam a exposição do assunto para exibir sua contrariedade com as cifras pagas ao governo, de modo geral. Queixam-se de pagar muitos tributos e receberem poucos investimentos da União na área da telefonia. E somam à conta de gastos o recente fim da lei que desonerava smartphones, agora taxados em 11,75% a título de PIX/Cofins.

Segundo a Telebrasil, o setor deixou R$ 60 bilhões para os cofres públicos no ano passado. Dessa soma, R$ 9 bilhões foram destinados a fundos setoriais de telecomunicações, incluindo os R$ 946 milhões do Condecine. Do outro lado, Ancine e produtores do audiovisual lembram que isso representa apenas 0,4% do faturamento bruto do setor de telecomunicações. A Telebrasil rebate, lembrando que a conta bruta não reflete o peso da taxa: em 2014, a Condecine representou, segundo o setor, 25% de seus lucros.

Por que o acordo foi rompido?

1. Em 2010, as teles defenderam a aprovação do novo marco da TV paga para entrarem no mercado de TV por assinatura. Por isso, aceitaram a proposta da Ancine, de redirecionar parte do que já pagavam de Fistel (taxa de fiscalização das telecomunicações) para a Condecine, que ajudaria a abastecer a demanda dos canais para o cumprimento das cotas de produção nacional exigidas na nova lei. Assim, as teles não seriam oneradas em mais tributos.

2. Em outubro de 2015, o Condecine sofreu um reajuste de 28,5%, o que significou um impacto de R$ 200 milhões para as teles, que tinham, desde 2011, a compreensão de um acordo tácito de que não haveria aumento tributário.

3. As teles alegam na ação que a verba repassada ao Condecine não lhes é revertida em qualquer benefício. A Ancine e entidades do setor contestam. Alegam que a produção nacional incentiva o consumo de serviços de TV e internet nos aparelhos móveis.

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