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Sick Boy (Jonny Lee Miller) e Renton (Ewan McGregor) acertam as contas. | Divulgação/
Sick Boy (Jonny Lee Miller) e Renton (Ewan McGregor) acertam as contas.| Foto: Divulgação/

Agora quarentão, Sick Boy (Jonny Lee Miller) só atende pelo nome de batismo, Simon. Begbie (Robert Carlyle), por sua vez, é o desgostoso pai de um universitário. Até Spud (Ewen Bremner) se esforça, sem muito resultado, para ter uma rotina longe do vício da heroína. Mas, na aguardada continuação do já clássico “Trainspotting”, as transformações são superficiais e o futuro ainda não chegou. “T2”, como foi batizado o filme de Danny Boyle vagamente baseado no livro “Pornô”, de Irvine Welsh, é uma ode à nostalgia bastante fiel a seus personagens. Se eles sobreviveram ao teste do tempo? Sim, talvez porque tenham se recusado a envelhecer além das rugas.

Os créditos iniciais mostram que o protagonista Mark Renton (Ewan McGregor) ainda é um apreciador da corrida. Só que o cenário parece muito mais asséptico do que em sua juventude ociosa. Ele corre agora numa esteira e não depois de bater a carteira de algum incauto. Ao voltar a Edimburgo 20 anos depois de ter traído seus melhores amigos, ele parece ter “escolhido a vida”, como outrora ironizara em um dos monólogos mais declamados do cinema nas últimas décadas. A aparência é saudável. O comportamento, estável. Ele convence como um cara que escolheu “boa saúde, colesterol baixo e plano dentário” ao deixar as drogas.

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No primeiro filme, Boyle teve de lançar mão de soluções ultracriativas para burlar o orçamento apertado. Em “T2”, alguns blockbusters depois (incluindo o oscarizado“Quem Quer Ser um Milionário?”), parece se esforçar para não ferir esse legado, o que resulta em nenhum risco assumido. Os flashbacks estão em todos os cantos, mais em reverência do que como recurso para ajudar quem possivelmente passou incólume sem ter assistido ao original. A velha versão de Renton parece querer emergir a toda vez que os hesitantes primeiros acordes de “Lust for Life”, de Iggy Pop, se insinuam na trilha sonora. Uma construção de identidade ao mesmo tempo verossímil e misteriosa, retorno à altura do personagem.

A cada passo que o protagonista dá em direção a um acerto de contas, essa memória vem à tona. Spud, o mais inofensivo dos quatro amigos, ganha um tanto mais de espaço quando assume involuntariamente a função de memorialista da juventude ferrada do quarteto, rabiscando diálogos e traduzindo situações nebulosas que escaparam aos olhos chapados dos demais. Sick Boy e Begbie ainda querem vingança.

O retorno de Renton coincide com a fuga de Begbie da cadeia e dos novos negócios de Sick Boy. Como o pub da família não lhe dá renda, “Simon” aplica golpes com a ajuda da namorada, Veronika (a búlgara Anjela Nedyalkova). O plano é aproveitar que o ex-amigo está na cidade para ampliar os negócios, estabelecendo um bordel.

Diane (Kelly McDonald), namorada adolescente chave-de-cadeia de Renton, cresceu e também retorna. É como se ela tivesse apenas trocado o uniforme escolar pelo terninho sem graça de advogada, já que ela pouco mudou fisicamente. Embora fosse bem mais jovem que os demais personagens, parece ser a única a ter crescido de fato. E talvez por isso seja difícil gostar dela.

Com esses ingredientes e mais o desejo de vingança histriônico de Begbie, com direito a perseguições em banheiros quase imaculados em comparação às latrinas que Renton frequentou nos anos 1990, “T2” atinge também um ponto de tensão pouco convincente, mas que serve para sepultar as máscaras impostas até então. O passado é para sempre.

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