Para cinéfilos americanos de uma certa idade, Sônia Braga será para sempre a personificação de uma quente atração sexual feminina, ainda que em virtude de sua performance no drama de 1985 “O Beijo da Mulher Aranha”.
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O último veículo de Braga, “Aquarius”, não fará nada para dissipar sua estatura mítica como uma das atrizes mais cativantes das telas: mesmo se aproximando dos 70, Braga projeta um ardente e leonino ar de confiança sexual. Com sua famosa cabeleira erguida acima do pescoço ou balançando atrás de si, ela caminha langorosamente por através de “Aquarius” como uma rainha vistoriando seus domínios – exceto que, nesse caso, sua autoridade não se restringe ao cenário do filme, mas abrange toda a tela e, por extensão, nossa imaginação coletiva.
Braga interpreta Clara, uma viúva de 65 anos que vive em um ensolarado apartamento refrescado pela brisa do mar em Recife, quando – inevitavelmente, dada sua privilegiada vista para o mar – é contatada por desenvolvedores imobiliários buscando comprar o imóvel para tirá-la de lá. Eles compraram todas as outras unidades no edifício levemente decaído, e agora estão tentando penetrar as defesas de Clara, primeiro com charme (o neto do desenvolvedor é particularmente talentoso na lábia de vendedor), depois com táticas mais agressivas. Mas eles claramente subestimaram Clara, que se torna mais irremovível em sua resolução de ficar mesmo quando seus próprios filhos a incentivam a se mudar para um lugar que seja mais “apropriado”.
Espectadores esperando por um convencional conflito Davi-e-Golias encenado ao som de samba ficarão surpresos e encantados com “Aquarius”, que foi escrito e dirigido por Kleber Mendonça Filho em um ritmo digno de uma heroína que imperiosamente se recusa a ser apressada pelos outros. O filme na verdade começa 30 anos antes, quando Clara e sua família se reúnem no apartamento para celebrar o aniversário de uma tia querida.
Envelhecimento
Em uma longa sequência de abertura que se desenrola vagarosamente, a audiência testemunha as associações e profundas conexões emocionais que o lugar e seus móveis adquirem ao longo de décadas de uso e heranças intergeracionais. (“Aquarius” leva o título do próprio prédio de apartamentos.)
Mendonça Filho toma seu tempo para observar a rotina e os rituais diários de Clara conforme ela faz seus exercícios de alongamento, conversa com sua empregada doméstica de longa data, mergulha no mar, se reúne com amigos e embarca em um breve envolvimento com um homem potencialmente interessante. O que para outros cineastas poderia ser uma série de digressões se torna a âncora de “Aquarius”, que se revela ser menos sobre as reviravoltas da história de Clara e mais sobre a confusa experiência do envelhecimento, o enigma entre corpo e mente, e como o ambiente físico se torna um símbolo tão potente de tempo, memória e sentido.
Como uma vitrine para Braga, “Aquarius” não é nada menos que triunfante, um espetáculo de uma mulher só de força, sensualidade e indomável perseverança. Céticos podem se incomodar com a crítica de Mendonça Filho ao materialismo e a ética do descartável da geração do milênio. (Uma das muitas conversas paralelas do filme diz respeito a vinil versus MP3.) Mas ele faz um argumento persuasivo, mesmo assim.
Até o momento da um tanto perfunctória mas furtivamente satisfatória conclusão, “Aquarius” faz um argumento contundente para desviarmos nosso olhar das nossas ubíquas distrações para absorvermos o mundo ao nosso redor – aquele em que vivemos e que, estejamos ou não cientes disso, vive em nós.
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