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Desde seu filme de estreia, "Pi" (1998), o diretor Darren Aronofsky não ia tão longe num mergulho na psicose como ele faz em Cisne Negro, um dos mais sinistros retratos do mundo do balé desde "Sapatinhos Vermelhos" (1948), da dupla inglesa Michael Powell e Emeric Pressburger.
O drama "Cisne Negro" (confira trailer, fotos e horários das sessões) concorre a cinco Oscars, incluindo melhor filme.
Da maneira como o filme é cuidadosamente conduzido, o espectador é levado a compartilhar a visão de mundo de Nina Sayers (Natalie Portman, favorita ao Oscar de melhor atriz e vencedora de vários prêmios, como o Globo de Ouro e o do Sindicato dos Atores, pelo papel). Junto com ela, enxerga-se os fantasmas e delírios da delicada bailarina, que ganha o cobiçado posto de protagonista do balé "Lago dos Cisnes".
O papel exige da intérprete que o executa não só perfeição técnica, o que Nina certamente domina, como uma dualidade psicológica avassaladora. Aparentemente, sua natureza frágil e tímida, na qual toda sensualidade e agressividade estão severamente reprimidas, só encontra as chaves para interpretar a virginal princesa Odete, o Cisne Branco. A Odile astuciosa e pérfida, o Cisne Negro, resta oculta e dormente, em algum ponto perdido de sua psique, que ela precisa desesperadamente despertar.
Esta impressionante viagem ao mundo interior de uma jovem bela e neuroticamente frígida, em pânico diante da possibilidade de entrega física e emocional, tem inúmeros pontos de contato com "Repulsa ao Sexo" (1965), de Roman Polanski - em que Catherine Deneuve interpretava a mulher psicoticamente dividida, ilhada em seu apartamento.
Atriz talentosa e dedicada, Natalie Portman supera não poucos obstáculos, inclusive físicos, para interpretar solidamente esta Nina trágica, que desperta piedade e medo quase ao mesmo tempo. A atriz rompe suas fronteiras e sua imagem, não hesitando numa cena de masturbação, nem em outra de sexo lésbico - que, na verdade, são as que menos impressionam.
É quando traduz a dualidade extrema desta mulher fraturada que não encontra sua síntese que Natalie exprime o melhor de sua arte. Seu sofrimento transpira humanidade, força, demência, amargura, e a impressionante solidão ao ir até um lugar onde absolutamente ninguém pode segui-la.
Ao seu lado, um competente quarteto de atores contribui decisivamente para o resultado: o francês Vincent Cassel ("À Deriva"), na pele do diretor da companhia que a pressiona e quer conquistá-la, sem decifrar seu tumulto interior; sua mãe (Barbara Hershey), que procura criar um halo de proteção para sua criatura, mas exagera na dose; sua colega e rival, Lily (Mila Kunis, "O Livro de Eli"), que funciona como um contraponto da jovem sensual e livre que Nina não sabe ser. E Beth McIntyre (Winona Ryder), a assustadora veterana que a precedeu no papel e enlouquece quando tem de aposentar-se da companhia - prenunciando um sombrio futuro para as bailarinas mais velhas.
Sem a fotografia contrastada de Matthew Libatique e a montagem áspera de Andrew Weislum - ambos indicados ao Oscar -, este pesadelo barroco jamais poderia completar seu espectro. Se "Cisne Negro" passa como um turbilhão, certamente, é porque todos estes componentes se ajustaram da maneira mais consistente. Darren Aronofsky parece estar no melhor de sua forma e poderia, sim, conquistar este ano seu primeiro Oscar como diretor. "Cisne Negro" concorre também como melhor filme.
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