A Festa Literária de Parati, em seus três anos de existência, tem comprovado seu poder de oxigenação dentro do mercado editorial brasileiro. Entre os lançamentos realizados durante o evento, realizado em julho, estão duas novidades da escritora homenageada este ano, Clarice Lispector. A começar por Outros Escritos, que reúne textos dispersos e inéditos. "Havia uma grande necessidade de publicar essa parte da produção de Clarice. Muitos desses escritos eram citados constantemente em estudos e conferências, mas não estavam disponíveis ao público em geral", explica Teresa Monteiro que, com Lícia Manzo, organizou o livro. Doutora em Letras pela PUC do Rio de Janeiro, Teresa também é biógrafa da autora e responsável pela edição de suas Correspondências. "Em Outros Escritos, tentamos seguir os mesmos critérios que a Clarice usou na segunda parte de Legião Estrangeira, intitulada Fundo de Gaveta. Nela, a escritora confessa um carinho especial por esse tipo de texto abandonado, reunindo seus próprios representantes alguns na forma de simples fragmentos", afirma.
O livro reúne 17 escritos, divididos em dez partes que abrangem os diversos gêneros com os quais a autora trabalhou. Na primeira parte, "Clarice Escritora Iniciante", encontram-se seus quatro primeiros contos publicados, datados da década de 40. Os textos refletem a autora em formação, buscando o refinamento de sua escrita. Em "Trecho", por exemplo, o estilo fluido tão próprio da escritora já pode ser entrevisto na humilhação sofrida por Flora ao esperar a volta de seu amado dentro de um bar.
Já em "Clarice Dramaturga", seu único roteiro para teatro é resgatado. Intitulado "A Pecadora Queimada e os Anjos Harmoniosos", a peça foi escrita em 1948, na Suíça. O original foi lido com entusiasmo pelos escritores Fernando Sabino e João Cabral de Melo Neto, que insistiram em sua publicação. Apesar disso, Clarice resistiu por muito tempo, até 1954, quando o incorpora a Legião Estrangeira. "Em suas cartas, ela afirma que sentiu muito prazer enquanto a escrevia, que se divertiu muito. No entanto, por causa dessa relutância, A Pecadora caiu em esquecimento, mesmo sendo um texto único dentro de sua obra", diz Teresa. A pesquisadora, contudo, tem boas notícias: Nicoli Algranti, sobrinha-neta de Clarice, está produzindo uma encenação do texto, que inicialmente terá palco no Sesc Belenzinho, em São Paulo. A direção ficará a cargo de José Antonio Garcia, com a atuação de Louise Cardoso, entre outros, inclusive da própria Teresa. A estréia está marcada para 17 de novembro.
Teresa destaca também os escritos de "Clarice Conferencista", no qual se encontram textos preparados para leituras públicas, como o conto "O Ovo e a Galinha", destinado para uma inusitada participação no Primeiro Congresso Mundial de Bruxaria, em Bogotá, em 1975. "O interessante desses texto é que Clarice comenta pela primeira vez o que ela considerava literatura, a sua idéia de vanguarda. Ela, que sempre foi avessa ao acadêmico, que sempre disse que não era uma grande leitora. Mesmo que toda a sua obra dialogue com esses conceitos, é somente aqui que a vemos trabalhar de maneira tão explicita com esse tema."
Outros Escritos se estende ainda por "Conversas C./P.", na qual estão registrados alguns diálogos dos filhos Pedro e Paulo quando ainda eram pequenos. A lista prossegue por capítulos tão diversos como "Clarice Colunista Feminina" e "Clarice Estudante".
O segundo lançamento é Aprendendo a Viver, que une imagens da autora com trechos de sua obra. Desta vez, Teresa Monteiro aliou-se ao fotógrafo Luiz Ferreira para produzir o livro. O resultado é um "livro que serve para apresentar o pensamento de uma autora que tem fama de ser difícil. É verdade que ela possui um texto singular, que apresenta algumas dificuldades, mas isso não é desculpa para elitiza-lá".
Fazer uma introdução à obra de Clarice Lispector por meio de fragmentos é uma idéia ilustrativa, já que era dessa forma que a autora trabalhava com frases soltas, que aos poucos eram encaixadas até chegar ao produto final. Porém, para que os antigos leitores não se sintam abandonados, Aprendendo a Viver traz a novidade das fotos, na sua maioria tiradas durante seu exílio na Europa, que possuem um aspecto familiar, cotidiano. "Tivemos essa preocupação estética, recortando a autora, uma mulher lindíssima. Já me disseram que somente com Clarice seria possível fazer um livro asssim. De fato, seus leitores são apaixonados por ela", conclui Teresa.
Moraes eleva confusão de papéis ao ápice em investigação sobre suposto golpe
Indiciamento de Bolsonaro é novo teste para a democracia
Países da Europa estão se preparando para lidar com eventual avanço de Putin sobre o continente
Em rota contra Musk, Lula amplia laços com a China e fecha acordo com concorrente da Starlink
Deixe sua opinião