
Está inscrita na história do cinema a cena em que Mia Wallace, personagem de Uma Thurman em Pulp Fiction Tempo de Violência (1994), dança sozinha ao som de "Girl, Youll Be a Woman Soon", na versão da banda Urge Overkill, natural de Chicago.
A releitura da canção de Neil Diamond, um clássico dos anos 70, não tem apenas a função de música de fundo. Sua letra é sobre uma garota que está prestes a passar por um ritual de passagem para a vida adulta. Como a própria Mia, mulher do gângster Marcellus Wallace (Ving Rhames), prestes a sair para a noite na companhia de um dos matadores de aluguel do "marido", o charmoso Vincent Vega (John Travolta) no filme que deu a Quentin Tarantino a Palma de Ouro e Oscar de melhor roteiro original.
Para o diretor, hoje um dos cineastas norte-americanos mais cultuados no mundo inteiro, a música não serve apenas para criar climas ou embalar cenas: ele, pessoalmente, escolhe todas as canções incluídas nas trilhas sonoras de seus longas-metragens. Geralmente, elas dialogam com o enredo e com as cenas, alterando sentidos como acontece no caso descrito acima.
"Girl, Youll Be a Woman Soon" é uma entre mais de seis dezenas de canções incluídas nos três CDs duplos da coleção Tarantino Experience Music from and Inspired by his Films. Não estão nos discos músicas utilizadas em todos os longas-metragens do cineasta. Apenas de Cães de Aluguel (1992) até os dois volumes de Prova de Morte(2007), passando por Pulp Fiction Tempo de Violência, Jackie Brown (1997) e os dois volumes de Kill Bill (2003/04). E também por filmes escritos pelo diretor, como Assassinos por Natureza (1994), de Oliver Stone ("Sweet Jane", dos Cowboy Junkies). Há, também, canções que poderiam constar de algum título de Tarantino, mas não estão em sua obra.
Nos repertório dos álbuns, os fãs vão encontrar clássicos da música americana, como "Jeepster", da banda T-Rex, ouvida em Prova de Morte; e "Midnight Confessions", do grupo The Grass Roots, incluída na trilha de Jackie Brown.
Na frente mais pop, um dos exemplos do uso orgânico e inteligente de música por Tarantino é "Dont Let Me Be Misunderstood", hit nos anos 70 do grupo franco-americano Santa Esmeralda. A faixa surge no filme Kill Bill Vol. 1 na espetacular cena do embate de espadas e artes marcais, na neve, entre a vilã O-Ren Ishii (Lucy Liu) e a Noiva, protagonista vingativa defendida com fúria e paixão por Uma Thurman, atriz-fetiche de Tarantino. Sangue jorra na tela no melhor estilo do diretor, que subverte a violência explícita dando-lhe outro sentido estético, ao som da música, marcada por guitarras espanholas e castanholas, tornando-se uma espécie de dança coreografada nos mínimos detalhes, arrebatada e hipnótica. A magia tarantinesca se faz de forma exemplar.




