Há duas semanas escrevi aqui neste espaço sobre o disco do Julião Boêmio, cavaquinista, compositor e arranjador de primeira. Dedicado ao choro. Desde então comecei a recordar meus encontros com este estilo musical urbano brasileiro, comparado ao jazz - se bem que surgiu antes que o jazz, numa mistura de ritmos e instrumentos europeus e africanos, promovida com a vinda da família real portuguesa para o Brasil. O choro é, ao mesmo tempo, um teste e uma diversão para os grandes músicos nacionais. Mas não só para eles. O primeiro contato que tive com esse estilo musical foi na casa de meus pais, em festas nas quais trabalhadores de mãos calejadas dedilhavam suave e precisamente seus instrumentos. Músicos amadores no melhor sentido da palavra. Para tocá-lo bem, é preciso tanto técnica quanto intuição.
Não se pode dizer que Curitiba seja a capital do choro do país. Afinal, só na Lapa carioca deve ter mais grupos de chorinho do que aqui. No entanto, a cidade já construiu, ao longo do tempo, seu lugar na propagação, estudo e recriação do choro brasileiro. Vamos lembrar.
O Choro e Seresta é o mais popular grupo de choro de Curitiba. Não deve haver na cidade quem ainda não o tenha visto e ouvido tocar alguma vez. Talvez pelo nome as pessoas não se deem conta. Mas, se você já foi alguma vez na Feirinha de Artesanato do Largo da Ordem, aos domingos, é quase certeza que tenha escutado algumas notas tocadas por este regional tradicional. Sim, é o grupo de chorinho que toca na Feirinha do Largo desde que ela existe. É uma das marcas de Curitiba, um som que embala os domingos da cidade ali ao lado do Relógio das Flores e agora com a companhia sempre presente do jornalista Nireu Teixeira - que ganhou uma estátua no local e reúne os chorões à sua volta, contando histórias e batucando sua caixinha de fósforos marca Pinheiro.
Também ali, no Largo da Ordem, surgiu, no início dos anos 90, o Conservatório de Música Popular Brasileira, idealização de Lúcia Camargo e direção artística do maestro Roberto Gnattali, sobrinho de Radamés Gnattali, um dos grandes incentivadores do choro nacional. Em torno do Conservatório, formou-se um núcleo de músicos de primeira e, com eles, surgiu o Clube do Choro de Curitiba.
Nomes como o clarinetista Sérgio Albach e do violonista e cavaquinista João Egashira apareceram nessa época e hoje estão à frente de dois dos mais conceituados grupos musicais brasileiros de música instrumental, respectivamente a Orquestra à Base de Sopro e a Orquestra à Base de Corda, ambas pertencentes ao Conservatório. Os dois foram catalizadores e propulsores de uma nova safra de musicistas curitibanos ligados ao choro. Respeitando o passado e abertos a influências modernas.
Em outra academia, a Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Embap), também existe um núcleo que reúne chorões semanalmente. Há ações anuais durante o Dia Nacional do Choro dia 23 de abril, data do nascimento de Pixinguinha que movimentam a cidade. Por dois anos seguidos, já se promove a maratona do choro na cidade, São 24 horas seguidas em que músicos revezam-se tocando o ritmo. Há também o Festival Curitiba no Choro, que traz compositores e músicos de várias partes do país para a cidade, concorrendo nas categorias composição e instrumentista. O tradicional Festival de Música de Curitiba também reúne chorões anualmente na cidade.
É por essas e outras razões que de vez em quando temos por aqui espetáculos dedicados ao choro que reúne instrumentistas nacionais e internacionais. Um deles vai acontecer nos dias 4 e 5 de junho, às 21 horas, o Teatro Paiol. No dia, Davi Sartori (piano), Gabriel Schwartz (flauta e sax), Julião Boêmio (cavaco), Graciliano Zambonin (bateria) e Jefferson Lescowich (baixo acústico), todos músicos da cidade, se juntarão ao clarinetista italiano Gabriele Mirabassi e ao pianista e maestro carioca Laércio de Freitas para o lançamento do CD Variedades Contemporâneas, que leva o nome do grupo e é todo dedicado ao choro. Lançamento pelo selo paulistano Sete Sóis com distribuição Tratore. E assim Curitiba cai no choro.
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