| Foto: Ricardo Humberto

Eu gosto de usar uma citação do biólogo inglês J.B.S. Haldane para falar do último romance de Joyce. Haldane disse uma vez que não só o universo era mais estranho do que a gente imaginava, mas era provavelmente mais estranho do que a gente conseguiria imaginar.

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O Finnegans Wake é que nem o universo.

Um crítico irlandês, uma vez começou um texto (elogioso) sobre o Wake dizendo que era primeiro importante deixar claro que o livro era ilegível. Harold Bloom diz que lê todo ano, mas que acha que o livro jamais será compreensível.

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Mas como é que pode?

O problema do Wake é que você precisa rever a tua noção de “leitura”. Se você tentar “entender” o romance como faz com os outros livros vai se frustrar. Exatamente como se você tentar entender uma supernova como um rojão.

Ele é mais estranho do que você consegue imaginar. Não se trata só de um livro complicado. Complicado, afinal, vem de um termo latino que quer dizer mais ou menos “redobrado”. E o que você precisa fazer, com um livro complicado, é meramente “desdobrar”: explicar. Em alguns casos dá mais, em outros, menos trabalho. Mas a escavação uma hora bate na rocha.

Não é assim com o Wake.

Mas se a gente é treinado a interpretar assim desde a escolinha… como fica?

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Por isso é que eu sempre digo pros eventuais e corajosos leitores que o negócio é primeiro conviver o suficiente com ele pra descobrir o quê, pra você, vai querer dizer “ler” aquele livro. Deixe ele te ensinar.

Eu já tive experiências, em sala de aula com um grupo todo perceptivelmente comovido, uma ou outra lágrima aparecendo aqui e ali, diante de um parágrafo que, se a gente tivesse quer resumir pra você naquela hora, ia descobrir que não conseguia. A gente ia dizer coisas como “parece que…”

Encontrar um jeito de dizer sem dizer pode ter sido uma das maiores contribuições do “incompreensível” romance de Joyce. Porque aí ele consegue dizer tanta coisa…

Mas vale ler o livro por isso?

Vamos voltar a Haldane. Dizem que uma vez, numa festa, ele subiu para pegar uma coisa no quarto. Depois de um tempo, a mulher dele subiu pra ver se estava tudo bem.

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Ele estava deitado, de pijama, dizendo: é que eu cheguei aqui e não lembrei o que era que eu precisava fazer, aí eu pensei “bom, se você veio pro quarto deve ser hora de dormir”, e entrei na cama…

Mas por que isso agora, Galindo? O Wake é um livro da noite. É um sonho, há quem diga. E é um livro sobre gente, gente estranha, gente fofa: gente.

Se você não entender, ponha o pijama e deite com ele.