| Foto: Ricardo Humberto/Gazeta do Povo

Uma vez eu e a Sandra estávamos de carona com uma amiga nossa, que pra seu próprio bem e por, digamos, adequação dramático-retórica, vai ficar sem ser identificada aqui.

CARREGANDO :)

Ela tinha acabado de tirar carteira (na verdade, estávamos indo com ela, no carro dela, meio que como parte da celebração por ela estar habilitada.. ela é um amor, e quis passar aqui em casa pra levar a gente comemorar com ela também) e você pode imaginar que o passeio foi tenso, em algum grau.

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Aquela freadinha básica que sai em soluços, aquele motor que morre no sinal e tal. Coisas que se devem, como sempre, tanto à pessoa ser nova no ramo quanto a estar sendo observada por gente mais ‘experiente’.

(Vai entre aspas ali porque eu estou longe de ser grandes pilotos, ok? Lembra o Pateta, que quando entrava no carro virava o Senhor Volante e saía cometendo barbaridades? Eu atrás do volante viro o Senhor Carretando Galento, de 95 anos de idade…) Mas nada de mais.

Como nada demais foi a saída toda. Graças em grande medida ao tio desconhecido. Louvemo-lo.Eis sua estória.

A gente ia numa pizzaria que tem um estacionamento próprio, logo ao lado (não que isso isente os cabras de cobrar aquela puta grana de valete, ou de ‘palafreneiro’, como diz um grande amigo).

Só que a entrada pro tal estacionamento é meio apertadinha, e tava tudo mal iluminado, e ela, a amiga, nunca tinha entrado ali.

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E todos esses elementos, somados, geraram na mente no motorista iniciante a única resposta possível como ‘abordagem’.

“Eu tenho que entrar ali na maior velocidade possível!”

E pois não é que na hora em que ela quase me salta o meio-fio e voa pátio adentro tinha um tio saindo do estacionamento e entrando na pizzaria? Ela freou a tempo. (Prometia, como motorista, afinal).

E o tio, lépido e fagueiro, deu um saltinho de lado pra evitar o que, não fosse isso, teria sido uma pancada na coxa. Acho.E sabe o que ele fez em seguida?

Deu um sorriso pra ela. E pra mim, que ia sentado no banco do passageiro.

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Todo mundo riu e a história ficou pra trás. Mas isso só até a gente, já sentado na pizzaria, ver o tio passando na nossa direção pra ir ao banheiro. E o que ele faz? Me dá um tapinha no ombro (foi atrás da minha cadeira que ele passou) e outro sorriso geral pra mesa.

Mas pense comigo. Se esse cara fosse um otário (tipo pra lá de comum) aquela noite podia ter acabado com gritarias, jantares azedados pra várias pessoas.

E ele fosse um otário e ainda encontrasse outro (repare nos masculinos envolvidos). Podia ter acabado em briga. Mas não.

Ele só foi bacana. E aquilo virou crônica. Ficou leve.

Eu penso direto nesse tio, sempre que vejo aqueles adesivos tipo “Gentileza gera gentileza”. Porque a gente sempre pensa nisso nos termos “sejamos todos gentis”, que quase invariavelmente significam tipo “seja gentil comigo que aí eu posso considerar ser com você.”Ou seja, a gente pensa do meu ponto-de-vista, sentado ali no carro, no milissegundo em que eu pensei que reações o tio podia ter.

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Mas a coisa de verdade, a coisa punk, é pensar do ponto-de-vista do tio. “Seja gentil mesmo quando não couber, quando for difícil, improvável.” Seja gentil até (não foi o caso, na batata, mas..) com quem não for com você. Essa que é a prova.

E isso é que pode mudar alguma coisa por aí.

Tio desconhecido da pizzaria, um muito obrigado deste humilde cronista.