Dalva e eu vamos visitar Lucca, o neto que mora em São Paulo e a gente vê muito pouco. Tocamos a campainha, a porta abre, a carinha aparece na fresta e ele fecha a porta.

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Depois, dentro do apartamento, estende a mão feito homenzinho, recebendo nossos abraços durinho feito boneco de pau, e fica nos olhando de longe.

Dalva então dá o presente, que ele pega logo. Senta no piso, para desatar o laço do embrulho. Puxa o papel, sem conseguir abrir, até nos lançar um olhar pedinte, então Dalva abre o embrulho e ele fala com voz frustrada: roupa... Mas mostramos que ele deve puxar assim, assim, e pronto: abre-se uma barraca! – e ele abre um baita sorriso.

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Depois olha a barraca como se esperando dela alguma atitude, até que Dalva fala entra, Lucca, entra, é tua barraca!

Ele entra. Logo sai, para buscar o urso de pelúcia, o cachorrinho de pano e o cavalinho de pau. Bota a cabeça para fora, sorri, volta a falar com os amigos de pau e pano, mostrando o urso desenhado na barraca, um novo amigo.

Dalva fica de quatro, enfiando a cabeça e pedindo para entrar. Entra, e o cavalinho tem de ficar com a cabeça de fora.

Lucca se alegra tanto com Dalva lá dentro que começa a rir, sufoca de tanto rir. Sai de repente, corre até o quarto, até a cozinha, cruzando o apartamento para lá e para cá, numa gastança de energia que dá gosto ver. Tropeça, cai mas levanta rindo, continua a correr a nos olhar e rir, até bater a cabeça num móvel. Chora, mas Dalva acena lá da barraca, ele volta a correr e rir, até voltar para a barraca suado e ofegante.

Pergunto que nome vai dar à barraca, me olha confuso; digo que, quando eu era menino, dava nome a tudo, até à minha cama e todos meus brinquedos. Então, que nome vai dar à barraca?

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Ele olha Dalva, que lhe sussurra no ouvido e ele abre sorriso antes de proclamar:

– Barracuca, a barraca do Lucca!

Dalva sai, peço para entrar na Barracuca, ele sério balança a cabeça permitindo; entro, gemendo e rangendo e arfando, sento com as pernas encolhidas e ele me olha orgulhoso, não sei se de mim, se da barraca, talvez de ambos.

Conto que, quando era menino, dormia na barraca, e ele sai correndo para pegar o travesseiro. Boto os bichos para fora, dizendo que eles gostam de dormir fora, olhando a lua. Mas não tem lua, ele diz. Tem sim, digo apontando a lâmpada, é a nossa lua, e ele concorda logo, claro, é a nossa lua.

Deita com a cabeça no travesseiro, e lhe afago os cabelos, ele sorrindo a olhar longe, além da lua, além das estrelas.

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Na hora da comida, senta entre Dalva e eu, mostrando como já come sozinho. Depois, no banheiro, me mostra como já faz pipi sozinho. É um moço, digo, já tem até barraca, não é? É, ele concorda balançando a cabeça e repetindo: sou moço, vô.

Uma palavrinha tão pequena, uma sílaba só, e destampo a chorar. Ele corre para a sala, vai direto para Dalva:

– O vô tá chorando!

Lá do banheiro, enxugando o rosto, ouço Dalva dizer com sua intuição apurada:

– O vô tá chorando? Não será porque o Lucca chamou ele de vô pela primeira vez?

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Pela fresta da porta, vejo Lucca balançar a cabeça, e fica me olhando como se me visse pela primeira vez.

Na despedida, ele de novo estende a mão, homenzinho arredio, mas, quando o elevador chega, corre e me abraça as pernas, e pergunta:

– Você vai voltar, vô?

Digo que vou voltar, sim, e então vamos de novo acampar na sala, e ainda agora vejo seu sorriso e seus olhinhos brilhando.

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