Na foto, a turma da terceira série ginasial, do Instituto de Educação Monsenhor Bicudo, está marchando no Sete de Setembro, em Marília, SP. Sou o primeiro da segunda fila. À frente do pelotão está o inesquecível Hiroshi. No primeiro dia de aula, o professor Isaac, de Educação Física, avisou a turma:
O senhor Hiroshi, quando era nenê, sofreu queimaduras nas pernas, num incêndio, que lhe deixaram muitas cicatrizes. Por isso, fará as aulas com calças compridas, e não quero ouvir nenhuma piadinha sobre isso.
Hiroshi levantou a mão para falar:
Mas o principal não queimou, professor...
Mesmo com as calças compridas, Hiroshi se revelaria o mais ágil em ginástica, o que saltaria mais alto e mais longe, quem mais encestava no basquete e, no futebol, defendia com garra e atacava com precisão. Também era o único que as meninas convidavam para jogar bola-queimada, para inveja geral da rapaziada.
Era bom até no detestado Francês de dona Rosinha, rigorosa e implacável nas notas. Hiroshi, porém, conseguia falar com perfeita dicção francesa, e um dia ela disse que devíamos fazer como ele, estudar bastante em casa. Ele levantou a mão:
Eu trabalho ajudando meu pai, professora, então não estudo em casa, professora, só presto atenção na aula.
Um dia, um colega pobre veio descalço, ficou humilhado pelos cantos, enquanto Hiroshi passava alegre pelos grupinhos:
Vou mostrar as pernas, mas só pra quem pagar.
Amealhou dinheiro de todos e, no meio duma roda de curiosos, subiu as calças e baixou as meias, mostrando as pernas tão queimadas que muitos tiveram nojo e disseram ah, devolve o dinheiro. Ele arrumou as calças e foi botar o dinheiro nas mãos do colega descalço, que no dia seguinte veio calçado.
Era por coisas assim que, no desfile, Hiroshi era sempre escolhido para marchar na nossa frente, e brincava:
Não é que desfilo bem, né, só tenho as pernas mais bonitas...
Hiroshi driblava com graça a desgraça, como quando falou a um colega reprovado:
Vou sentir saudade de você, colega, mas a gente sempre vai poder se ver no recreio...
Pois eu tenho saudade é de você, Hiroshi. Banzai!
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