Não torço por time algum, moleque fui perna de pau, mas, vendo o veterano Paulo Baier comemorar gol com alegria de menino, lembro que o futebol me deu lições inesquecíveis.

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Em 1958, eu menino vinha pela rua, vejo aqueles homens amontoados na porta do boteco, no silêncio contrito ouvindo um rádio fanhoso, até que, de repente, pularam e gritaram loucamente, e um me falou com olhos arregalados:

– O Pelé fez mais um, guri, vamos ser campeões do mundo!

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Assim descobri que o futebol amoleca os homens.

Depois, nos anos 60, no Bar do Tio Mário em Londrina, Maurício Saraiva, Beluce Beluci, Arnaldo Bertone e eu ousamos torcer contra o Brasil, porque vivíamos numa ditadura de direita e a adversária Hungria era comunista como nós então (cegos para o fato de que a Hungria vivia sob uma ditadura de esquerda...). Toda a patota do bar virou a cara para nós, e Tio Mário resumiu:

– Vocês não nasceram na Hungria, meninada – com o que aprendi a colocar meu país acima de ideologias.

Depois, nos anos 80, morando em Sampa, só vou ao Morumbi ver futebol porque a Folha de São Paulo inventou de botar escritores comentando os jogos, lá fui eu. Ainda bem que meu amigo Zé Bola foi junto e me mostrou:

– Um zagueiro avançou, vai mudar todo o jogo! – e comecei a aprender o grande xadrez do futebol, passando a ver com olhos táticos o que antes parecia só correria. Daí passei a ver melhor também o maior dos jogos, que é a vida, tão cheia de esquemas como o futebol.

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Noutra Copa, o baixinho Romário subiu entre aqueles dois baita zagueiros e fez gol de cabeça... porque fingiu que ia pular e os dois pularam antes, perdendo o tempo da bola. Aprendi a grandeza das pequenas espertezas, a importância dos detalhes.

O futebol também me fez apaixonar por um homem, ou melhor, um moleque crescido, Mané Garrincha. Pesquisei sua vida no arquivo do jornal O Estado de S. Paulo, onde uma dia fiquei ilhado por uma enchente, escapei com água pela cintura, me prometendo escrever uma baita biografia daquele homem que todos achavam abobado e, no entanto, fez sete gols olímpicos registrados pela Fifa, porque treinava bater escanteio depois dos treinos; e foi quem inventou a bola fora para que adversário contundido possa ser atendido.

No entanto, Ruy Castro escreveu a biografia do Mané antes de mim. Não me chateei; aprendi tanta humanidade com Garrincha! Chorei quando vi meu ídolo abobalhado, no final da vida, desfilando sentado num carro alegórico de escola de samba, mas entendi tudo depois de ler, na sua biografia, que seus avós índios lhe davam mamadeira de pinga com canela e mel quando nenê...

Um dia, na sala de espera da Rádio Paiquerê, em Londrina, vejo um senhor negro, sentado ali esperando. Olhei bem, perguntei seu nome, ele falou Djalma Santos.

– Já sabem que o senhor está aqui?

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– Ainda não, mas pediram para eu chegar nesta hora.

– Chamei o pessoal da rádio, Djalma Santos estava ali e ninguém se tocava?! Ele sorriu:

– Zagueiro vive de esperar, meu filho.

Aprendi a grandeza da humildade.

Em 2011, meu neto Pietro só chuta com a perna esquerda. A gente pode rolar a bola do lado direito dele, ele gira o corpo para bater com a perna esquerda. Se começar a bater bola firme, vou lhe contar que me chamo Domingos não porque meu pai também se chamava Domingos, mas porque era fã de Domingos da Guia. E com meu pai aprendi a maior lição do futebol:

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– Jogo só é bonito quando batem só na bola.

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