Defendo a inclusão da agenda do ensino infantil como gênero literário, ao lado do romance, do poema, do teatro. Se não for tanto pela inovação da escrita, será pela relevância como conteúdo, ao qual os pais correm salivando todo fim de tarde para descobrir o quanto o filho comeu, quantas fraldas sujou, do que brincou.
Trata-se de obras ousadas, que utilizam a justaposição de conteúdos alimentares e escatológicos. Os legumes da sopa da tarde são informados logo abaixo da informação de que está assadinho. Basta pular uma linha.
Em que outro registro da escrita é possível encontrar orações como “em prono mantém a cabeça e o tórax fora de apoio” lado a lado com “mamãe, precisamos de fraldas!”
O clímax vem no fim do bimestre, com a avaliação. Trata-se de um texto, de duas ou três laudas, todinho falando sobre seu filho. Tem assunto melhor?
Ali diz timtim por timtim o quanto ele é especial, e como já se desenvolveu até um pouquinho além do esperado. Já coloca objetos dentro de recipientes. Sabe brincar de “cadê? achou!” Come tudinho, só não gosta da escarola das quintas-feiras.
A maior qualidade é que todas as entradas do diário infantil são positivas. As informações sempre atestam como o dia foi sensacional e extraordinário, o que vem seguido de muitos corações pintados à canetinha.
Aliás, o gênero agenda escolar dialoga profundamente com as artes visuais. Quando não são suas páginas que vêm recheadas de desenhos, papeizinhos grampeados solicitam que os próprios pais realizem tarefinhas em casa. Coisa simples, como colorir bonecos representando a família, modelar a mão da criança em argila, enviar fotos, muitas fotos.
Afazeres que devem se complicar paulatinamente ao longo dos 30 anos seguintes.