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O menino e a menina es­­ta­­vam parados diante da janela.

Ele grudou o nariz na vidraça e disse que o mundo lá fora estava virando lama. Lá fora? estranhou a irmã. O mundo é lá fora, insistiu ele. Aqui dentro é a casa.

Já haviam discutido essa questão muitas vezes, sem chegar a um acordo.

Ele dizia:– Lá fora é o mundo. Aqui é a casa.

– A casa faz parte do mundo, bobo.

– Não sou bobo! A casa tá no mundo, mas é outra coisa. Lá que é o mundo – e espetava o dedo na janela.

Ela desistiu. Disse, desconsolada:

– Que chuva chata.

– Muito chata, aceitou ele, para acabar com a discussão.

– Será que tá chovendo na cidade toda? ela perguntou.

– Acho que sim, disse ele, percorrendo com o olhar o céu carregado de nuvens.

– Coisa chata, insistiu ela.

– Acho que tá chovendo no mundo todo.

Ela pensou um pouco e disse:

– No mundo todo, não. Tem lugar que não chove.

Ele pareceu incrédulo:

– Não chove nunca?

– É. A professora mostrou um lugar onde não chove nunca e lá as casas nem têm telhado.

– Verdade?

– Foi o que ela disse.

O menino olhou para cima e ficou imaginando como seria um buraco bem ali em cima da cabeça deles.

– Coisa esquisita.

– Divertida, disse ela. A gente olha e vê o céu e as estrelas. Já pensou num céu grandão cheio de estrelas? A gente deita na cama e fica olhando as estrelas.O menino seguiu olhando para cima e, súbito, viu um buraco imenso que o encheu de medo.

– Credo! fez ele.

– Que foi?

– Parece que a gente pode cair no céu...

Ela riu:

– Que bobagem! A gente cai pra baixo, não pra cima.

Ele ficou um tanto ofendido. Não gostava de ser chamado de bobo. Disse:

– Eu sei. A gente cai pra baixo. Mas dá...

– ...um frio na barriga?

– É, um frio na barriga. E se o céu for um buracão pra sempre?

– Daí a gente viaja pelo céu.

Ela saiu correndo pela sala de braços abertos. Ele a acompanhou achando que a irmã era mesmo muito maluca. Parecia um avião.

– Você parece um avião.

– Um passarinho.

– Tá bom, passarinho. E do que a gente vai brincar?

Os dois voltaram para a janela, como se brincar exigisse que aquela chuva terminasse de imediato, o sol secasse as árvores, o solo, a grama, os canteiros, os passarinhos.

– Chove há três dias, não é?

Ela sorriu:

– Tá chovendo desde o começo do mês, seu bobo.

Ele reagiu:

– Eu não sou bobo! Já te disse.

– É distraído, tá bom?

Ele calou-se, aceitando que era distraído.

– E você é muito espertinha, disse ele.

– Sou mesmo!

E os dois dispararam em nova perseguição maluca pela casa, aos gritos, até ouvirem a voz da mãe vindo lá da cozinha: chega de correria!

Voltaram à janela. A chuva aumentava.

– Chato, né?, comentou ela.

– Muito chato, concordou ele.

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