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Após ataques terroristas, a exemplo desse ocorrido na Noruega, somos massacrados por imagens da tragédia. Imagens chocantes, destruição e morte, o horror em praça pública. Nesse caso, temos ainda os corpos de meninos e meninas assassinados na ilha de Utoya.

O que justificaria a matança de meninos e meninas? Como entender que alguém possa ferir de morte quem apenas passava por uma das ruas de Oslo? Que mal cometeram esses meninos e meninas? A quem feriram essas pessoas?

Diante de tamanha insanidade, no entanto, há uma imagem que me parece a mais aterradora de todas. Nela não há sangue, não há expressão de desespero ou dor, não há sofrimento.

Esse que agora sabemos se chamar Anders Behring Breivik é visto na janela de um carro de polícia. Ao contrário do transporte de presos no Brasil, ele não está socado no porta-malas de uma viatura. Está bem acomodado, ao lado de um policial, trajando uma espécie de camisa de cor laranja ou vermelha, que lembra um colete.

Seu rosto é sereno, cheio de claridade. Tem um porte orgulhoso. Não chega a ser hostil, mas é desafiador. Seu olhar é firme, quase doce, pacificado. O­­­lhos azuis dirigidos a um ponto indefinido, mas que miram todos nós, que vemos a foto. Ele nos olha e nos despreza. Está completamente absorto pelo grande momento que vive. Afinal chegou às páginas de todos os jornais, às telas de todas as televisões. É um fenômeno global. Au­­tor de um grande feito, percebe-se que está feliz e não denuncia, no rosto redondo e quase infantil, qualquer culpa, ressentimento ou dor. É um homem realizado.

Essa é a foto mais terrível de todas as que a mídia fez circular.

Os atos terroristas – venham de onde vierem – são por definição covardes. Produtos de mentes insanas, nos deixam face a face com o incompreensível, aquilo diante do que falecem todos os nossos argumentos, todas as nossas convicções e esperanças. O que dizer ou pensar diante de um homem feliz pela execução de dezenas de inocentes?

Nada.

Olho para a foto e vejo ali um homem convicto. Um homem que tem uma certeza absoluta de que fez o que deveria ter sido feito. Eis o terror. O sangue e as mortes são mero acidente, pura contabilidade. A destruição, não apenas de vidas, mas de esperanças, é coisa secundária. O que esses olhos azuis e esse sorriso irônico nos dizem é que estamos diante de uma criatura superior, que agiu movida por princípios elevados. Está acima das hesitações nas quais todos nos movemos. Acima do bem e do mal, além de qualquer julgamento. Aliás, deseja usar o julgamento como tribuna. Não há crime que tenha cometido.

Essa certeza de representar uma verdade absoluta define a insanidade. Uma das grandes conquistas da humanidade é a dúvida, a incerteza, a imprecisão, o não saber. O ser humano começou a pensar assim que descobriu a dúvida. Se não sei, busco saber. Se duvido, investigo, refaço meus argumentos, busco novas provas. Das minhas incertezas saem críticas contra arbitrariedades ou prepotências. Das imprecisões e mesmo defeitos que vejo em mim, resultam me­­lhoras, avanços, descobertas.

Assim, nada mais aterrorizante do que um homem que não tenha dúvidas. Nietzsche, com a genialidade desconcertante de sempre, escreveu: "a certeza enlouquece". Chesterton deu à questão sua pincelada de ironia e paradoxo: "o louco é aquele que perdeu tudo, exceto a razão". O louco está certo sempre. O louco sempre tem razão.

Eis como nos tornamos reféns de terrorismos de diversos tipos. Alguns fanáticos tentam se justificar em crenças religiosas delirantes, em isolamentos tribais, em equívocos raciais. Outros, em limites nacionais, diferenças de gênero, de comportamento se­­xual, de escolhas políticas. É o resultado da negação do outro, aquele que exige que eu duvide de mim e me coloque em questão. O fanático teme o outro e, no mesmo ato, teme a si mesmo.

E o terror nos brinda com o olhar angelical dos iluminados.

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