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Os leitores me desculpem, fui vencido. Vou escrever alguma coisa sobre a calamitosa participação do Brasil na Copa. Não queria, por ser meio óbvio e porque os meios de comunicação estão entupidos com matérias a respeito. Mas não resisti. Desculpem-me.

O Brasil, ao contrário da Alemanha e da Argentina, que foram desclassificadas jogando tudo que podiam e sabiam, foi derrotado pela França como se não passasse – e não passava – de um bando de desfrutáveis reunidos para uma pelada entre casados e solteiros.

Na verdade, nem isto. Nas peladas de final de semana há empenho, luta, sobram botinadas. A rapaziada do Parreira perdeu com a cara limpa de sempre, como se nada estivesse acontecendo. Afinal, os contratos publicitários continuam, as loiras, os carrões, as pulseiras e as correntes de ouro com que se empetecam continuam cintilando.

O pior é que os acontecimentos esportivos revelam com transparência o que se passa no país. No caso desta desclassificação, a forma cínica e frouxa com que o time deixou a competição revela o que se tornou o Brasil após o reinado de oito anos do nunca suficientemente esquecido FHC – reinado feito de soberba, arrogância, distância com o populacho nativo –, mais o mandato em curso do Inácio, que colocou o país nos limites do ridículo, com desfiles de corrupção, ausência de qualquer projeto político que não seja o apego mecânico ao poder pelo poder. Enfim, vivemos nestes últimos anos a soberania do cinismo e do salve-se quem puder.

Não foi diferente a seleção. O espetáculo mais revelador aconteceu na entrevista de Parreira e Zagalo, quando este último, um Forest Gump tupiniquim, reagiu à ameaça de ser defenestrado do cargo. A seu lado, Parreira não pediu demissão com dignidade, como fez o técnico da Argentina, com muito menos culpa no cartório mas com uma dose maior de vergonha na cara.

Este apego ao poder, ao cargo, às sinecuras, aos holofotes, custe o que custar, doa a quem doer, o sucesso pelo sucesso, eis algo diante do que Mário de Andrade usaria sua fórmula notável: "Tão Brasil!"

Esta atitude revela mais sobre o estado atual do país do que quilos de ensaios sapientíssimos gerados pelas universidades. Observando com cuidado, vemos que jogadores e treinador fizeram aquilo que faz a sociedade brasileira nesta nefasta era que devemos ao Fernando e ao Inácio. Nas livrarias, nos jornais, nas rádios, nas palestras corporativas, nos papos dos colunáveis, o que vemos é o endeusamento do sucesso pelo sucesso, a exaltação de um individualismo feroz.

Foi o que se viu na seleção. Individualmente, o culto ao sucesso: um bateu o recorde de gols do Pelé (sem chegar aos pés do Pelé, convenhamos), outros bateram o recorde de partidas, de participação em copas, de jogos, de vitórias, de convocações etc. A cada recorde, uma entrevista na televisão.

Após a derrota, jogadores e comissão técnica deram um espetáculo constrangedor, com traços de pura alienação – não no sentido marxista, no sentido psiquiátrico mesmo. Derrota? Esta é uma geração vencedora! Não ganhamos porque os franceses jogaram bem demais! Não é pitoresco? Esperavam que os franceses jogassem mal para nós ganharmos?

Mais uma vez, não é diferente do que se passa no país.

FHC faz de conta que foi, no governo, de uma pureza ética absoluta. Nada de compra de votos para a reeleição, nada de catastrófico nas negociatas com as estatais. Já o Inácio, que não sabe de nada, também não tem nada a ver com os desastres nacionais, seja a corrupção, o uso da máquina estatal em proveito próprio, negociatas familiares etc. Ele tapa buracos. O outro fazia biquinhos de intelectual francês. Ambos cultivam uma esperteza malandra, um inspirando-se na elite paulista e, o outro, escolado nas rodadas de sinuca nos botecos do ABC. Dois individualistas vorazes.

Enfim, seus governichos se parecem: os dois perderam para a França. FHC, naquele momento, se escondeu no palácio. Lula, agora, lembra a mesma atitude acovardada que teve quando o Evo Morales mandou-o às favas: colocou o rabo entre as pernas e foi cantar noutra freguesia, logo ele, que tirava fotos assistindo aos jogos pela televisão.

A um pobre cronista com a mente cansada, como diria o Drummond, de tanto "mentar", só resta o registro do desastre que é, infelizmente, muito maior do que perder um jogo de futebol.

Tão Brasil!

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