Uma senhora americana, doutora por alguma Universidade daquelas redondezas e dirigente de uma Ong, anda fazendo campanha para que não se use celulares. Dá câncer, diz ela. Diminui pela metade a produção de espermatozoides. Terá ela alguma prova disso? Confessa que não tem. Suspeito que não fez nenhuma contagem da taxa de espermatozoides, mas fica indignada quando lhe pedem provas; diz que é preciso agir de imediato e não esperar provas para agir quando já for tarde demais.
Que maravilha de lógica, não é mesmo? Professora universitária. Doutora.
Pois eu fiquei aqui matutando, a respeito de outros alarmismos semelhantes a essa advertência da professora.
O amigo leitor já fez um levantamento de quanta coisa já foi acusada de ser fatal para a nossa saúde? O Jamil Snege se atormentava com essa questão e, diante do volume de coisas maléficas a nossa volta todas deliciosas, aliás acabou chegando à conclusão de que "viver faz mal à saúde". Conclusão irretocável. Aos mortos pouco importa a qualidade dos alimentos, o mal causado pelos agrotóxicos, o fumo ativo ou passivo, os celulares. Os problemas só aparecem quando se trata de quem está vivo. Quem está vivo é que é o problema.
Foi aí que me lembrei do tomate. Já foi crucifixado como a pior praga gerada pela lavoura. Acusavam os japoneses de terem entupido os tomates com antifungicidas, venenos, defensivos etc., pois, era dito, só isso explicaria que os tomates ainda existissem. Deixados a si mesmos, teriam sumido há muitas décadas. Seriam resíduos pré-históricos capazes de gerar tantas e tais doenças que nem era bom pensar. Bombas recheadas de veneno, assim eram vistos os tomates.
Pois não é que eles se recuperaram? Japoneses e não japoneses continuaram a produzir tomates, a turma não deixou de comê-los, hoje já existem tomates com grife de orgânicos. Foram vencidas as pragas, as calúnias, os medos. E mais: descobriu-se que o tomate faz bem à saúde, tendo várias virtudes, entre elas a de prevenir câncer, em particular o de próstata. Dizem ser rico em licopeno, vitaminas, fósforo, potássio.
Não é pouco para quem esteve à beira de uma condenação capital.
Outra praga era o café. Um mal medonho, causador de azia, má digestão e úlcera. Produzia nervosismo, taquicardia, insônia. Campanhas foram disparadas, o café cambaleava e muita gente passou a evitá-lo e a falar mal dele. Os que tinham úlcera lamentavam serem obrigados a evitar um simples cafezinho.
Eis que se descobre não apenas que o café não tinha nada com isso, mas também que a úlcera não é causada pelo cafezinho. Antes mesmo que o café estivesse à mingua, ele voltou a ser saudado como aquilo que sempre foi: um prazer inigualável, uma bebida digna dos deuses. E mais: quem passou a ocupar o papel de vilão foi o açúcar ele faria mal, não o café.
Hoje, o café deixou de ser uma espécie de primo pobre entre as bebidas e é servido e cultivado por baristas, passado em máquinas sofisticadas, tendo uma variedade enorme de tipos e de qualidades. O que não impede que, na maioria dos casos, o café servido no Brasil seja da pior qualidade, sem contar o hábito pavoroso de ser servido já adoçado.
A única ameaça atual ao café, a meu ver, é o surgimento de especialistas equivalentes aos sommeliers. Com seus discursos complicados, os conhecedores são capazes de nos desanimar diante do simples ato de beber um bom vinho ou um bom café.
Agora, essa senhora ataca os celulares. Confesso que não sei se ela tem ou não razão. Eu, que não gosto de telefones, fixos ou móveis, só aderi ao celular há poucas semanas, depois que uma falha no meu carro me deixou às três da madrugada numa rua deserta e sem ter como chamar socorro. Comprei um celular para uso exclusivo em emergência, cujo número não revelo nem sob tortura.
Mas, apesar de minha bronca com telefones em geral, fico pensando se dentro de alguns anos não serão descobertos os benefícios dos celulares.
Baseado no caso do tomate e do café, defendo, profeticamente, que o celular não faz mal algum à saúde. Saúde física, acrescento. À saúde mental, que me perdoem os adeptos, faz um mal danado.
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