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Outro dia, uma jovem e bastante promissora estudante de Jornalismo me perguntou, sem a formalidade da mão levantada em sala de aula, o que é preciso para aprender a escrever. A resposta mais óbvia, sempre na ponta língua, é: "Leia!". Mas hesitei – tenho medo de verdades absolutas, e de sentenças definitivas.

A habilidade da escrita, de expressar ideias, contar histórias, e narrar o mundo, enfim, está mesmo muito relacionada ao hábito da leitura, que se adquirido na juventude se torna orgânico. Uma necessidade fisiológica até, capaz não apenas de ensinar, mas de nos dar pistas de quem somos, e de onde viemos.

Ler também nos permite içar velas e, ironicamente, escapar de nós mesmos, o que, convenhamos, é uma bênção. Nem que seja por alguns minutos, quanto estamos no ônibus rumo ao trabalho, ou à espera do sono.

Além da leitura, que nunca deveria ser uma obrigação, mas uma necessidade existencial, creio que, para aprender a traduzir as coisas do mundo em palavras, tão importante quanto manter um namoro eterno com os livros e suas variantes, é preciso a aprender a ouvir.

Acontece que nos tempos velozes, onde falar com o outro, e travar contato com o mundo, seja no outro lado da rua ou do planeta, está ao alcance dos dedos, escutar não é prática corrente. Tornou-se uma arte dominada por poucos.

Todos temos muito a dizer, mais até do que somos capazes de embalar sob a forma de um discurso coerente, articulado e bem embasado. Mas a prática da escuta, por conta desse imediatismo todo, que tem um componente narcisista muito acentuado, parece um tanto arcaica, obsoleta. Demanda paciência, desejo e interesse pelo outro, e a capacidade de tirar o próprio ego da tomada.

Se ler ajuda a criar um repertório amplo de palavras, conhecimentos e ideias, que, quando articulado, é capaz de produzir sentidos tão sutis (ou contundentes) quanto precisos na escrita, ouvir são outros quinhentos.

A habilidade da escuta é o reconhecimento da existência, e da relevância desse outro. Há, talvez, lá no fundo de tanta resistência, o medo do desconhecido, de ver abaladas algumas certezas, construídas em bases muito frágeis. Vai que as convicções do outro sopram tão forte que a casa cai, nos deixando sem teto nem lei. Muitos preferem não correr o risco. A intolerância nunca está descartada.

Mas voltando à aluna de Jornalismo que busca receitas, ou métodos, para escrever, volto a duvidar das minhas certezas. Confio mais na intuição que aponta em direção da observação atenta, e realmente interessada, do mundo. Da leitura apaixonada, e menos funcionalista. E, finalmente, da maravilha que é a descoberta da escuta. Quem sabe ouvir, aprendi meio na marra, dificilmente está só.

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