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Buster Keaton ao lado do grandalhão Ernest Torrence: pai e filho muito diferentes (na aparência) | Divulgação
Buster Keaton ao lado do grandalhão Ernest Torrence: pai e filho muito diferentes (na aparência)| Foto: Divulgação
  • Na cadeia, sentado sobre o delegado, Buster tenta resgatar o pai, que não quer saber dele

O mundo desaba ao redor de Buster Keaton (1895-1966), ao pé da letra às vezes, e a resposta dele é uma atitude quase impassível. O homem de rosto petrificado nu­­n­­ca ri nem chora, mas diz tudo o que é preciso usando os olhos enormes e o corpo minúsculo.

Buster escreveu, dirigiu e atuou em filmes mudos produzidos nas décadas de 1920 e 30, nos Estados Unidos. Não era famoso como Charles Chaplin nem boa-praça como Harold Lloyd. Seus personagens inspiravam mais admiração do que ternura. Buster encarnava uma espécie de super-herói sem identidade secreta. A transformação acontecia diante de todo mundo.

No começo das histórias, ninguém acredita que ele possa fazer qualquer coisa – seja vencer uma luta de boxe, conduzir um trem ou comandar um navio –, porém, até o desfecho, ele terá feito tudo isso e mais.

Buster vive figuras obstinadas. Os problemas surgem em pilhas, mas ele resiste, revida e resolve os pepinos um por um.

A General (1926) costuma ser encarada como a obra-prima de Buster. Não faz muito tempo, um crítico americano escreveu que o filme é bom a ponto de você nem notar que é mudo – uma outra forma de dizer que não envelheceu nem um pouco. Essa comédia provavelmente inventou o que mais tarde seria o filme policial (a perseguição de locomotivas é genial e fundadora). É difícil se cansar de ver A General, mas, conhecendo a obra-prima, o próximo passo é ver Capitão Bill Jr.

Trata-se de um filme completo, com drama, humor, suspense, romance e aventura. É surpreendente e parece muito simples (mas não se engane, é complexo). O roteiro é "bem amarrado", como se costuma dizer, e os efeitos especiais impressionam até hoje. Anote: o filme é de 1928. O DVD saiu no Brasil pela Videofilmes e, nos EUA, acaba de ser lançada uma edição especial, in­­cluindo muitos bônus.

O efeito especial mais incrível de todos é, exatamente, Buster Keaton.

Ele interpreta Jr., filho do Capitão Bill, o dono de um barco a vapor que faz travessias pelo rio Mississippi. Nos minutos iniciais, o pai está possesso porque acabou de ganhar um concorrente que promete pulverizar a clientela. Pouco depois, recebe um telegrama avisando que Jr. chegará de Paris, onde passou uma temporada estudando.

Bill (o grandalhão Ernest Torrence, que parece ainda maior ao lado de Buster, que tinha apenas 1,68 metro) fica eufórico com a notícia e não vê a hora de encontrar o filho.

O rapaz chega, usando boina e um bigodinho ordinário. De modos delicados, usa um cravo branco na lapela para que o pai possa reconhecê-lo. Demora, mas os dois se encontram e Bill não disfarça a frustração – não se conforma de ter um filho intelectual e faz uma "patrulha da moda", comprando outro chapéu e levando-o ao barbeiro a fim de raspar os fiapos acima do lábio.

Em seguida, o pai tenta explicar ao rapaz como operar o barco a vapor e Jr. é uma negação. Não faz nada direito, é desastrado e vira motivo de piada entre os outros tripulantes.

Tudo está errado e fica pior. Depois de partir para a agressão contra o concorrente que tenta tirá-lo do mercado, Capitão Bill termina preso.

Aqui o filme se transforma e a mudança acontece a partir de uma notícia de jornal: a meteorologia prevê uma tempestade violenta e, surpresa!, ela cai como previsto.

Ao mesmo tempo, o filho apatetado começa a dar sinais de ousadia. Para tirar o pai da cadeia, enfrenta o pé d’água e leva um pão recheado com ferramentas, mas Bill não quer saber dele. Recusa-se a recebê-lo na cela.

Outras situações engraçadas se desenrolam até que um guarda descobre as intenções de Jr. e o golpeia na cabeça, colocando-o no hospital.

A tempestade é furiosa, capaz de levantar construções do chão, arrastar carros e arrancar árvores. O vento leva embora a estrutura do hospital e empurra as camas pelas ruas da cidade. Quando Buster desperta, não entende o que se passa. Fica de pé e...

A cena é uma das mais sensacionais do cinema. A parede imensa de uma casa de dois andares, feita de madeira, desaba sobre Buster, que só não é esmagado porque está parado exatamente no ponto de uma janela aberta. A estrutura se espatifa no chão, a janela é grande o suficiente para poupar Buster e parece que sobram menos de dois dedos de cada lado dos ombros. Sem dublês, confiando em cálculos matemáticos e na marcação que preparou antes da cena, o ator age como se nada tivesse acontecido. Superbuster. Dizem que a equipe saiu do set porque se recusou a presenciar a gravação, enquanto o operador de câmera olhou para o outro lado.

Nos últimos 15 dos 69 minutos de filme, Jr. faz tudo o que não pensava possível fazer. É a determinação dos personagens de Buster que coloca a história em movimento. É a capacidade de cair, se quebrar e levantar para cair e se quebrar de novo. Sempre imperturbável.

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