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Show da banda Radiohead,em setembro de 2009, em São Paulo: momento feliz | Marcos Hermes
Show da banda Radiohead,em setembro de 2009, em São Paulo: momento feliz| Foto: Marcos Hermes

A Declaração de Independência dos Estados Unidos, de 1776, garante em seu texto original o direito à "vida, à liberdade e à busca pela felicidade". O reconhecimento desse anseio humano é notável, ainda mais se pensarmos que ocorreu em um momento no qual a noção de indivíduo ainda não estava totalmente consolidada em grande parte do mundo. A Revolução Francesa e a Declaração dos Di­­reitos do Homem e do Cidadão aconteceriam apenas 13 anos mais tarde, sob a influência dos ventos de democracia que sopravam do outro lado do Atlântico, do Novo Mundo.

É curioso perceber que os fundadores da nação norte-americana fizeram questão de deixar claro que todo o ser humano (excetuando, àquela época, os escravos) tinham, por lei, assegurado o direito de procurar o pote de ouro no fim do arco-íris. Mas sem a certeza de que um dia iriam, de fato, encontrá-lo (isso a Declaração não diz, mas está implícito).

É intrigante a ideia por trás do conceito da busca pela felicidade, de gigantesca complexidade emocional, filosófica e política. Será mesmo possível procurá-la, persegui-la como um objetivo a ser alcançado? Provavelmente não, se levarmos a proposta de "busca" ao pé da letra.

O que os revolucionários norte-americanos pretendiam dizer ao incluir essa frase tão profunda e algo enigmática em seu texto fundador merece discussão. Decerto falavam, mais do que de felicidade no seu sentido mais existencial, do exercício pleno da liberdade. De escolher caminhos, errar, corrigir, cair, levantar e seguir vivendo. Isso mesmo, o direito de ser, orientados pela bússola do livre-arbítrio. Também de­­veriam estar pensando na possibilidade concreta de prosperar, construir uma casa e, nela, um lar.

Se a felicidade está ou não nessa trilha, ou se com ela se confunde, é algo tão essencialmente individual, que é inútil elocubrar a respeito. Cada um tem (ou não) sua resposta. Ouso, contudo, na imensidão da minha pequenez, dizer que a felicidade, pelo menos enquanto estado permanente, é uma utopia. Uma miragem.

Quando tento definir o que é ser feliz, caio sempre no fragmentário, no aparentemente trivial e insignificante. Sair de um filme mexido, diferente do estado de alma em que eu estava quando as luzes do cinema se apagaram. Uma conversa intensa, pessoal e inteligente, com pessoas de quem eu gosto e admiro; ou com alguém que descubro querer conhecer melhor. Um show de rock, como o da banda Radiohead, em São Paulo, há quase dois anos. A visão espetacular e azulada de um glaciar sob a luz do sol no extremo sul do mundo. Fechar um livro com pena de tê-lo terminado. Acordar ao lado de quem amo. Tudo isso, para mim, é motivo de suprema – e fugidia – felicidade.

São momentos breves, muitas vezes esparsos, mas de inegável ressonância na soma dos dias. Caso contrário, a existência seria insuportável. Entre esses instantes sublimes, epifânicos, sigo vivendo. Com a liberdade de buscá-los, persegui-los, mesmo sabendo que vão acontecer à revelia da minha vontade, quando eu não estiver procurando.

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