Devo a minha mãe o hábito de cumprimentar estranhos. Apesar de tímida, e um tanto reservada em seu dia a dia, ela também tinha um genuíno interesse pelas pessoas, não importa quem fosse. O ascensorista, a vizinha que pegava o ônibus no mesmo horário que ela, o dono da padaria que puxava papo. Com todos, e sem muito esforço, ou a intenção expressa de parecer simpática, iniciava conversas banais, que aos poucos evoluíam, com o passar dos dias, meses e até mesmo dos anos, para vínculos que, embora em grande parte circunstanciais, criavam em torno dela uma rede de gentileza e cordialidade. Levei um bom tempo, talvez até demais, para compreender a verdadeira importância disso.
O aprendizado do que eu vou chamar aqui de civilidade cotidiana, na falta de expressão melhor, não se deu por meios tradicionais: nunca houve uma conversa, uma lição de boas maneiras na sala de estar, ou à mesa do jantar. Acontecia enquanto a vida acontecia e as situações pediam um estender de mão, um "Bom dia!", um "Como vai?".
Lembro-me como se fosse hoje de entrarmos apressados em um táxi, para escapar de um chuva inesperada e tipicamente curitibana que começava a cair no centro da cidade. Àquela altura, eu já com uns 14, 15 anos, deveria estar habituado com a fiscalização materna, mas ainda tropeçava no meu alheamento de adolescente ensimesmado. Vivia no mundo da Lua, ao qual ainda retorno com alguma frequência,
Bastava contar até três, e lá vinha o beliscão, que poderia ser literal ou verbal: "Cumprimenta o moço!". Não era a primeira nem a última vez que ouviria aquela frase, e suas variações, Os cutucões se estenderam até o fim da adolescência e, ouso confessar, mesmo quando eu já era adulto, barba na cara. Em elevadores, portarias de prédios, filas de supermercado ou balcões de confeitarias. Na vida real, enfim.
Por trás desses apelos triviais, nunca carregados de uma autoridade vazia, ou mero didatismo, mas sim de cuidado e bem querer, talvez ela quisesse me alertar sobre a importância de perceber a extensão limitada do espaço que ocupamos no mundo. Mostrar que o outro esse muitas vezes desconhecido do qual com frequência fugimos, seja por timidez, pressa ou mesmo descaso importa, sim. Ele faz diferença e, de certa forma, nos define, já que nesses pequenos gestos de sociabilidade, corriqueiros e aparentemente desimportantes, exalamos nossa essência, revelamos do que somos feitos. Uma lição de mãe nunca tarde demais para aprender, mesmo que ela e seus "beliscões" hoje só vivam em minhas lembranças.
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