| Foto: Cosac Naify/Divulgação

No livro A Parte Que Falta, o escritor e desenhista Shel Silverstein (1930-1999) conta uma história que parece simples com desenhos que parecem simples, mas o resultado, estranhamente, não tem nada de simples.

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Talvez o efeito do livro, publicado pela Cosac Naify com tradução de Alípio Correia de Franca Neto, tem a ver com as lacunas que Silverstein deixa para o leitor preencher. E elas são tão grandes que é impossível não buscar (e encontrar) significados incríveis na historinha.

Tenha em mente que o livro é encarado como literatura infantojuvenil, então você é livre para ler ali só a aventura de um personagem que rola à procura da sua "parte que falta". Esse protagonista parece um Pacman (personagem do jogo "come-come"), um sujeito "com cara de pizza faltando um pedaço" na descrição do poeta Fabrício Corsaletti.

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A sutileza dos traços é acachapante. Quando o cara-de-pizza está parado, por exemplo, ele se confunde com a linha do horizonte. Quando se move, ele flutua sobre a linha e um detalhe pequeno como esse é capaz de criar a sensação de movimento.

O herói encontra todo tipo de partes estranhas. Uma é pequena demais e não encaixa, outra é grande demais e também não encaixa. Uma terceira é perfeita, mas ele não segura direito e a perde pelo caminho. Outra, ele aperta demais e ela quebra.

Sozinho de novo, ele vive aventuras, cai em buracos e tromba contra paredes de pedra. Mais adiante, encontra uma parte legal e eles se entendem. Ficam juntos e rolam juntos.

Antes, quando a parte não existia, o Pacman não conseguia rolar muito rápido e então parava para conversar com uma minhoca, cheirar as flores e podia apostar corrida com um besouro. Com a parte, ele era completo e rolava rápido sem chance de parar para minhocas, flores ou besouros. Quando ele percebe o que está acontecendo, chega a uma conclusão surpreendente, toma uma decisão nada romântica e o desfecho – como muitos outros de Silverstein – abre várias possibilidades em vez de encerrá-las.

A historinha trata de relacionamentos. Porém, em vez de falar de panelas e tampas (dizem que cada panela tem uma tampa, mas algumas pessoas são frigideiras), ele escreve sobre partes de alguma coisa, sobre pedaços (pieces, no original).

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Cinco anos depois de A Parte Que Falta, em 1981, saiu A Parte Que Falta Encontra o Grande O (The Missing Piece Meets the Big O, a sair no ano que vem). Com os dois livros, Silverstein chega perto de explicar o ser humano usando uns rabiscos geniais.