Não há sequer uma cena de jogo em Violência Máxima, produção britânica sobre o dia-a-dia de um violento grupo de hooligans. E não poderia ser diferente: torcedores brigões parecem pouco se importar com o futebol jogado em campo, canalizando toda sua energia na troca de sopapos com os rivais.
As brigas, no entanto, nem sempre acabam em band-aids e hematomas. Quando se perde o controle da situação, o que não é raro, o pior pode acontecer. Tommy (Danny Dyer), o personagem central da história, se dá conta do perigo às vésperas de completar 30 anos. Tem um emprego razoável e uma certa “qualidade de vida” (seja lá o que isso quer dizer), mas isso não lhe basta. Entre uma rotina careta e a adrenalina das confusões armadas por sua turma de torcedores do Chelsea, prefere a segunda opção. Vale a pena?
Essa é uma das perguntas do filme, que chega direto às locadoras brasileiras sem passar pelos cinemas. Lançado em 2004, Violência Máxima causou polêmica em vários países da Europa. A começar pela própria Inglaterra, onde o longa do diretor Nick Love foi acusado de estimular as hostilidades entre torcidas. Era o ano da Eurocopa, realizada em Portugal, e algumas autoridades chegaram a vir a público para condenar a produção.
“Se as pessoas vão a Eurocopa para brigar, acho que o farão independentemente de assistir a uma hora e meia de filme. Se acharmos que o filme é tão poderoso que pode incitar a violência, é porque temos egos grandes demais”, defendeu-se, na época, o diretor. Ele tem razão, mas pelo menos um incidente diretamente relacionado ao longa aconteceu na cidade sueca de Malmö, onde duas torcidas rivais quebraram o pau na saída do cinema.
Baseado no romance The Football Factory, de John King, Violência Máxima é uma espécie de Trainspotting (clássico dos anos 90, também inspirado em livro, sobre um grupo de drogados escoceses) em versão futebolística. O ritmo é de videoclipe, a trilha sonora traz pérolas do pop e um certo humor negro dá o tom da narrativa. As drogas, claro, correm soltas do início ao fim. A maior semelhança entre os dois filmes, contudo, está justamente no conflito dos personagens principais: acomodar-se nos padrões da sociedade de consumo ou partir para a aventura, mesmo que isso o torne um criminoso?
Ao ir além do diagnóstico simplista de que os hooligans são um mero “caso de polícia”, Violência Máxima abre caminho para teses de todos os tipos. Ainda mais quando se percebe que os brigões ingleses não são mortos de fome cuja única diversão é o futebol. “Somos ingleses, entramos em todas as grandes guerras que aconteceram até hoje”, justifica Tommy em uma de suas reflexões.
Desmond Morris, zoologista e especialista em comportamento humano, costuma dizer em seus livros que o esporte substituiu a caça. Não à toa, a grande maioria das práticas esportivas se baseia em apontar, mirar e acertar um alvo. Somando-se a isso o fato de que, no passado, jogo e guerra se misturaram nas arenas de gladiadores, é possível entender porque os esportes atraem o interesse das multidões – e muitas vezes acabam em confusão. Quem segura um instinto desses? GGG
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