Consagração baiana

Brasília – Um cineasta que não lançava um filme há quase 20 anos, estreante em longas-metragens, foi o grande vencedor do 38.º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. "P..., vocês querem me matar. Nós somos muito pobres!", foi a resposta do baiano Edgard Navarro aos sete troféus Candango que seu Eu Me Lembro recebeu na premiação realizada na última terça-feira, na capital federal. Desnorteado, Navarro chegou até a cair do palco depois de receber o prêmio de melhor diretor (nada grave aconteceu). No total, a produção levou R$ 130 mil em prêmios.

Cultuado pelo média-metragem SuperOutro (de 1986, citado até na música "Cinema Novo", de Caetano Veloso), o diretor de 56 anos teve muitas dificuldades para finalizar Eu Me Lembro, pensando até em desistir de fazer cinema. Mas o resgate da memória de sua infância e juventude, um trabalho que remete ao cinema de Federico Fellini em Oito e Meio e Amarcord, foi reconhecido no tradicional evento candango com os prêmios de: melhor filme do júri oficial e da crítica; melhor direção e roteiro, ambos para Navarro; melhor atriz, Arly Arnaud; e melhores ator e atriz coadjuvantes, respectivamente Fernando Neves e Valderez Freitas Teixeira.

Outro longa vencedor em Brasília 2005 foi o documentário À Margem do Concreto, do jornalista Evaldo Mocarzel, laureado com três Candangos: melhor filme pelo júri popular, melhor som e prêmio especial do júri oficial. "Nós somos cidadãos deste país. Conseguimos alcançar o cinema, agora precisamos colocar nossa imagem na porta dos palácios e dos governos", lembrou Verônica Kroll, líder do Movimento dos Sem-Teto de São Paulo, uma das personagens retratadas no filme que fala sobre o problema de moradia na maior cidade brasileira.

Os demais prêmios ficaram assim divididos: O Veneno da Madrugada, de Ruy Guerra – melhor fotografia e direção de arte; A Concepção, de José Eduardo Belmonte – melhor montagem e trilha sonora; e Incuráveis, de Gustavo Acioli – melhor ator, Fernando Eiras. O longa Depois Daquele Baile, de Roberto Bomtempo, foi o único a não ser lembrado na premiação.

Os curtas Rap, o Canto da Ceilândia, de Adirley Queiroz, e Rapsódia de um Homem Comum, do pernambucano Camilo Cavalcante, foram os destaques na entrega dos prêmios de curtas-metragens. O primeiro, que retrata a cultura hip-hop em uma das cidades-satélites do Distrito Federal, recebeu os troféus de melhor filme pelos júris oficial e popular. O outro trabalho ganhou nas categorias melhor filme pela crítica, direção, ator (Cláudio Jaborandi), além do prêmio aquisição do Canal Brasil (também recebido pelo documentário O Som da Luz do Trovão, de Petrônio Lorena e Tiago Scorza).

Avaliação

O Festival de Brasília foi feliz em sua seleção de longas-metragens, que comprovaram o bom momento do cinema brasileiro em 2005. Não houve, porém, nenhuma grande produção, que se destacasse – apesar dos merecidos prêmios, um tanto exagerados para os atores, é bom lembrar, Eu Me Lembro tem sérios problemas em seu terço final, que retrata os anos 70 no Brasil.

Todos os filmes apresentados demonstraram mais qualidades do que defeitos (venceriam com facilidade o Festival de Gramado deste ano), podendo fazer boa carreira no cinema se obtiverem distribuição decente – dois deles já tem exibição garantida: O Veneno da Madrugada, que fechou com a UIP, tem previsão de estréia para fevereiro de 2006; Depois Daquele Baile, da Mais Filmes, deve chegar aos cinemas em abril próximo.

O repórter viajou a convite do Festival de Brasília