O canadense Daniel Taylor tem um timbre muito especial. O som agudo e cristalino, semelhante ao de uma mulher, mas com a potência de um homem, é tão bonito que durante vários séculos uma atrocidade médica foi cometida para que outros músicos pudessem desenvolver uma voz parecida. Os castrati, que tiveram seu auge durante o Barroco, eram cantores que durante a adolescência passavam por uma cirurgia para remoção dos testículos. Só assim as famílias garantiam que os hormônios não estragariam sua sonoridade quase infantil.
O último castrato morreu em 1922. Desde lá, ninguém mais teve a coragem de fazer a operação necessária para manter a voz aguda. E só a sorte revela de vez em quando um tipo como Taylor, que naturalmente consegue cantar à maneira dos infelizes emasculados. A esse tipo de cantor, com um timbre mais agudo do que o dos tenores, se dá o nome de contratenor. Quem nunca ouviu um e quiser saber como isso soa, terá uma boa chance hoje à noite, quando o cantor abre a série de concertos BankBoston em Curitiba.
Em Curitiba, Taylor apresentará dois tipos de repertório diferentes. Começará com música de compositores anônimos e com um dos mais importantes compositores ingleses de todos os tempos, John Dowland (1563-1623). Para essa primeira seção, o cantor terá acompanhamento de um alaúde uma espécie de precursor medieval do violão. Na segunda parte, canta música do século 19, de Mahler, Schubert e Schumann. Dessa vez, acompanhado de piano. Também ao lado do painista, cantará dois compositores de períodos intermediários: Gluck e Haendel. Para finalizar, haverá um dueto com a soprano Marie-Eve Munger.
"Acho que seria um erro fazer um concerto inteiro apenas com repertório romântico", afirma Daniel Taylor, explicando porque preferiu fazer um programa variado. "Um recital é uma jornada emocional", resume ele, que já veio duas vezes para o Brasil, mas nunca havia cantado em Curitiba antes. Na jornada de hoje à noite, serão perto de três séculos de viagem. "Sempre me pedem para fazer John Dowland e acho que vai ser uma boa experiência poder fazer isso junto com a música do Romantismo, também", comenta.
"É um concerto raro devido ao timbre de voz do Daniel", afirma Alvaro Colaço, produtor da série BankBoston em Curitiba. Colaço lembra que Curitiba é uma das poucas cidades brasileiras que conta com um bom contratenor, Paulo Mestre, que se apresenta geralmente junto com a Camerata Antiqua de Curitiba. "Mas um recital-solo como esse é uma oportunidade imperdível", diz ele.
A série trará seis concertos nesta temporada a Curitiba. Todos ocorrerão no Guairinha, com espaçamento médio de um mês entre um e outro. O próximo, que já está marcado para o dia 30 de junho, será com um trio de alemãs tocando música dos séculos 19 e 20. O projeto do BankBoston é um dos mais importantes na área de música erudita no Brasil. Há 13 anos, o banco traz para temporadas em cidades brasileiras alguns dos principais conjuntos de câmara do mundo. Atualmente, além de São Paulo, que foi a sede pioneira do programa, recebem concertos da série as cidades do Rio de Janeiro, Porto Alegre e Brasília. Em Curitiba, será o primeiro ano de apresentações.
Serviço: Daniel Taylor. Guairinha (R. XV de Novembro, s/n.º), (41) 3315-0979. Hoje, às 20h30. Ingressos a R$ 36. Para clientes BankBoston, R$ 24. Pacote para os seis concertos a R$ 160 e para clientes BankBoston, R$ 105,00. Compra pelos telefones (41) 3253-0003 e 3304-7982.
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