Cristovão Tezza já havia chegado bem próximo ao Prêmio Jabuti, quando ficou em terceiro lugar na categoria romance com a obra "O Fotógrafo" em 2005. Nesta terça-feira, o reconhecimento veio com o primeiro lugar para a obra "O Filho Eterno", autobiografia ficcional que retrata por meio de uma abordagem na terceira pessoa a convivência de Tezza com seu filho, hoje com 27 anos, que sofre de síndrome de Down. "Eu não tinha idéia", disse o escritor sobre o Prêmio em entrevista à Gazeta do Povo.
"Estou impressionado com a quantidade de e-mails que estou recebendo. As pessoas conhecem o Prêmio Jabuti, é o único prêmio literário realmente popular no Brasil", comentou Tezza, que apesar das inúmeras críticas extremamente positivas que a obra recebeu em seu lançamento em 2007, se mostrou surpreso com o reconhecimento. "O Filho Eterno" já recebeu o Prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte como melhor romance em 2007, e é finalista do Prêmio Portugal-Telecom de Literatura 2008.
Professor da Universidade Federal do Paraná, Tezza disse que o ano foi "muito difícil". "Estou vivendo de fama faz um ano, tenho que organizar meu tempo para voltar a escrever mais", contou ele aos risos. No entanto, ele diz já ter começado a trabalhar em um novo romance, e adianta que será "uma história de amor".
Leia a íntegra da entrevista com Cristovão Tezza:
Você recebeu hoje o Prêmio Jabuti. Como foi que você soube da notícia?
Um amigo meu de São Paulo, o Ubiratan Brasil do Estadão, me ligou logo em seguida.
"O Filho Eterno" teve críticas extremamente positivas. Você esperava receber o Prêmio?
Eu não tinha idéia. Eu já fui finalista outras vezes, e o livro "O Fotógrafo" ganhou terceiro lugar. Mas desta vez fiquei em primeiro.
Qual é a meta a partir de agora?
Eu estou trabalhando em um novo romance, mas como estou vivendo de fama faz um ano (risos), tenho que organizar o meu tempo para voltar a escrever mais. Foi um ano muito difícil para mim.
Por essa questão do tempo?
Estou com muita coisa, muita palestra, resenha, crítica, e mais as aulas na Federal. Preciso dar uma organizada no meu tempo.
Você espera colher mais frutos com a obra?
Eu acho que o Prêmio Jabuti é uma boa alavanca. É incrível como é popular. Estou impressionado com a quantidade de e-mails que estou recebendo. As pessoas conhecem o Prêmio Jabuti, é o único Prêmio literário realmente popular do Brasil.
Quem sabe ganhar um Prêmio Nobel, que ainda não foi alcançado por nenhum brasileiro?
(Risos) não, não penso nisso.
Você almeja por uma adaptação ao cinema?
Algumas pessoas já se interessaram em roteirizar os meus livros, e já me disseram que a minha literatura é bastante cinematográfica e visual. Mas nunca chegou a dar certo. É muito caro e muito difícil. Se você pegar grandes autores da literatura brasileira são raras as adaptações. O processo é muito difícil. Mas eu ficaria feliz.
Você disse, em entrevista à Gazeta do Povo publicada no ano passado, que "O Filho Eterno" seria um acerto de contas com o seu filho. Por que a terceira pessoa permitiu uma abertura tão maior do que se você contasse a mesma história como "eu" e não "ele"?
Eu "ficcionalizei", ou seja, eu me transformei em personagem. Ou seja, quando você lida com personagem, você tem uma liberdade absoluta. A apropriação da linguagem é diferente. Com o personagem você pode bater à vontade (risos). Ao optar pela forma do romance, eu me livrei da escravidão biográfica. Isso me deixou à vontade para falar da experiência.
O "ele" em "O Filho Eterno" é um escritor frustrado, que se sente aquém do seu real potencial. Este relato é autobiográfico?
De certa forma sim, com relação à fase que ele faz referência. A frustração do personagem que passa anos escrevendo e não chega a lugar nenhum, não consegue publicar. Então eu acredito que o romance marca este aspecto, que é um tanto universal com todo mundo que escreve. É uma fase muito difícil, pois ninguém estoura "de cara", é um processo muito doloroso até você ser reconhecido. Veja que eu estou ganhando o Prêmio Jabuti com 56 anos.
Depois dessa obra, você se assume com uma maturidade maior?
Tenho uma relação mais tranqüila com o meu trabalho.
Ao escrever um romance e se colocar no papel de um narrador, você consegue a liberdade para encarar e dizer coisas que não seriam ditas de outro modo. A realidade apresentada deste modo não é, talvez, um pouco distorcida?
A ficção tem um outro modo de encarar a noção de verdade. Você recria experiências humanas, situações emocionais. Eu não estou preocupado por ter sido realista ou não realista, mas sim por ter sido verdadeiro, que é uma coisa de outra natureza.
Você acredita que as pessoas, em geral, buscam uma fuga para encarar um assunto incômodo, e desta forma, não o encaram como deveria?
Sim, eu acho que isso é verdadeiro em muitos aspectos da vida. Para todo problema que você tem, você tem mecanismos tranqüilizadores. E seria muito difícil viver sem isso. A função da literatura é justamente quebrar isso.
Com "O Filho Eterno", você concluiu uma etapa que precisava ser feita: a de escrever sobre o seu filho. O que acontece agora, depois da conclusão desta etapa?
Eu estou escrevendo um romance que é uma história de amor, e a minha idéia é que seja tão densa quanto o anterior.
Você leciona na Universidade Federal do Paraná. Por que você não escolheu a opção de viver apenas dos livros, e optou por ter grande participação também na área acadêmica?
A questão fundamental para quem escreve é ter vivido, eu não consigo viver de livros. Na vida real, eu sou professor acadêmico. Eu faço jornalismo cultural, e eventualmente ensaios. Mas é uma área profissional.
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