Em Pátio, a câmera instalada do lado de fora das grades registra tudo que ocorre enquanto os detentos estão diante da lente| Foto: Divulgação
Pouco Mais de um Mês: o diretor no papel principal

Nenhum longa-metragem brasileiro foi incluído na programação oficial do 66.º Festival de Cannes, que acontece na cidade do sul da França entre 15 e 26 de maio. Dois curtas-metragens nacionais, no entanto, foram selecionados para importantes mostras. Pátio, do cineasta baiano radicado em Curitiba Aly Muritiba, é o único latino-americano entre os dez títulos que competem na Semana da Crítica. Já o mineiro Pouco Mais de um Mês , de André Novais de Oliveira, participa da Quinzena dos Realizadores.

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Tanto um quanto o outro iniciaram suas respectivas trajetórias rumo ao festival quando foram exibidos na 16.ª Mostra de Cinema de Tiradentes, realizada entre 18 e 26 de janeiro na cidade histórica mineira, na qual estavam presentes olheiros do festival francês, que fazem a triagem de longas e curtas para suas respectivas mostras.

Pátio, de Aly Muritiba, é um documentário de 17 minutos e foi rodado com recursos próprios ao longo de três semanas em novembro de 2012 na Casa de Custódia de São José dos Pinhais. O curta tem uma única locação: praticamente toda a ação se passa no pátio interno do presídio. A câmera instalada do lado de fora das grades, visíveis durante toda a duração do curta, registra tudo que ocorre enquanto os detentos estão diante da lente.

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Muritiba, que foi agente prisional na mesma instituição por vários anos, conhece bastante de perto o cotidiano dos presos e escolheu um dos detentos, que ele identifica como "Tatu", para ser uma espécie de personagem provocador no documentário, um interlocutor. "A escolha dele se deu pela posição que ele ocupava junto aos outros presos. Por ser professor de capoeira, ele exercia um certo papel de liderança entre os outros detentos, de modo que ter sua confiança era meio caminho para conquistar a dos outros presos. Ademais, o filme fala de liberdade, assim como a capoeira, de modo que precisava de um capoeirista. Sugeri o filme a ele, que prontamente aceitou o convite."

Pátio é o segundo episódio da Trilogia do Cárcere, iniciada com A Fábrica – curta de ficção que recebeu dezenas de prêmios dentro e fora do Brasil, além de ter sido pré-selecionado para o Oscar. O terceiro episódio será o longa-metragem A Gente, um híbrido de ficção e documentário, já rodado e em fase de edição, também sobre o sistema penitencário. "Deve ficar pronto em junho. Só depois de ele trilhar uma carreira em festivais, vamos para o lançamento comercial, que deve acontecer em 2014."

Câmera escura

Ainda sem data de estreia prevista em Curitiba, Pátio foi selecionado para a prestigiosa Semana da Crítica, um das duas mostras paralelas do Festival de Cannes. A outra é a Quinzena dos Realizadores, da qual participa Pouco Mais de um Mês, de André Novais Oliveira.

O diretor conta, em entrevista concedida por e-mail à reportagem da Gazeta do Povo, que a inspiração para o filme veio de um momento íntimo entre ele e a namorada, Elida Silpe, também atriz do filme. Numa manhã, ela lhe mostrou um fenômeno ótico de "câmara escura" em seu quarto, situado no terceiro andar do prédio onde mora – ao atravessar um furo na cortina, o reflexo da luz do sol surgia no teto, sob a forma de projeção, uma imagem invertida da rua. "Foi o ponto gerador da ideia do roteiro, a fagulha. Pensei num momento em que um casal acorda e vê aquilo no teto, como isso tem algo a ver com o cinema, com a projeção, e como era algo simples que gerava um diálogo intimista entre os personagens."

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Embora Oliveira e Elida vivam personagens que têm seus nomes e também são namorados, o filme não é documental, garante o diretor. "A história do casal do filme não aconteceu de verdade. Pequenas partes do filme foram tiradas do relacionamento entre eu e Elida, como é o caso da hora em que ela me mostra a câmera escura, mas a base da história é ficcional."

Oliveira, junto com os cineastas Gabriel Martins e Maurílio Martins, montou, em 2009, a produtora Filmes de Plástico, que realizou Filme de Sábado (2008) e Dona Sônia Pediu uma Arma para Seu Vizinho Alcides (2012), de Gabriel, Fantasmas (2009), assinado por Oliveira, e Contagem (2010), dirigido em parceria por Gabriel e Maurílio. Todos foram premiados e selecionados para vários festivais.