Eliane Prolik caminha pelas dependências da Casa Andrade Muricy, não sorri em um primeiro momento, mas está muito contente. Até mais feliz do que estaria se a exposição em cartaz fosse com obras de sua autoria.
Nas paredes, mais de 50 quadros de Miguel Bakun. Depois de dez anos pesquisando o universo do pintor, ela finalmente conseguiu compartilhar com a comunidade um recorte da produção desse expressivo artista.
Pinheiros. Fundos de quintal. Paisagens marítimas e urbanas. Bakun recriou com verve única, ou palheta autoral, a aldeia em que esteve inserido. Eliane sabe que o talento do artista foi lapidado na adversidade.
De origem humilde, lutou muito para se tornar um personagem, seguramente um dos protagonistas, no cenário artístico paranaense, que para muitos não passa de miragem, ou no máximo ficção.
O que impressiona Eliane é que Bakun se reinventou a cada novo quadro. Não seguia nem mesmo os próprios padrões. Cada pincelada era uma nova descoberta. A arte como resultado de um mergulho no desconhecido no caso dele, na tela em branco. Depois de vários passos, muitas palavras, Eliane sorri. Mas fica melancólica ao lembrar que a exposição termina dia 9 de agosto.
Eliane, curitibana, é de origem eslava. Bakun também. Ele nasceu em Mallet, no sudoeste do estado, mas migrou ainda criança para a capital. Ela conheceu os quadros dele quando era pequena. Adulta, tomou a decisão de estudar suas obras especificamente, em 2000, durante um curso de pós-gradução na Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Embap).
Essa exposição e um livro com textos críticos e reproduções de quadros são alguns dos resultados da imersão que Eliane fez no universo de Bakun.
Um mal-estar ainda "assombra" Curitiba, no que diz respeito às homenagens a Bakun. Uma lenda diz que ter recebido uma "caixa de lápis de cor" como prêmio em um salão de artes, teria sido o elemento deflagador do suicídio do artista, em 1963.
A própria Casa Andrade Muricy, que abriga essa exposição, já teve um de seus "espaços" com o nome de Bakun. Há quem pergunte: por que a Casa não se chama Miguel Bakun? Andrade Muricy, que colecionava quadros do artista, não iria se opor se estivesse vivo, especula-se à boca pequena.
Eliane muda o foco. Ao invés de falar em morte, lembra que neste ano (no dia 28 de outubro) comemora-se o centenário de nascimento do artista daí a exposição a colocar o público em contato direto com sua obra, o que também é uma celebração da vida de Bakun.
Depois de 9 de agosto, a exposição sai de cena e deve seguir rumo a São Paulo e Rio de Janeiro (e talvez até Mallet). Mas isso apenas ano que vem, depois de alguns arranjos. Os paranaenses, os brasileiros, precisam (o verbo é esse mesmo) conhecer, quem sabe descobrir, Bakun, um moderno, que passou a exemplo do escritor paranaense Newton Sampaio (1913-1938) quase despercebido pela História.
Passam algumas horas de interlocução e Eliane não esconde mais a alegria ela faz questão de manifestar gratidão aos colecionadores e entidades que cederam quadros para a mostra. O prazer que diz sentir ao tornar visível a obra de outro artista, como Bakun, ela já experimentou em outras ocasiões. Seja quando recuperou o espólio de Raul Cruz ou durante a força-tarefa que viabilizou a aquisição de obras de Andy Warhol e Hélio Oiticica (e outros) para enriquecer o acervo de espaços públicos curitibanos.
"Vida, luz e movimento são predicados que necessito em meus quadros." A frase, de Bakun, está estampada em uma das paredes da Casa Andrade Muricy. E parece, mesmo, definir a arte desse homem que pintou muito em telas de 45 por 55 centímetros mas que conseguiu expressar, com tinta a óleo, força e inventividade que não ficam restritas aos limites da moldura.
Serviço:
Miguel Bakun: A Natureza do Destino. Casa Andrade Muricy (Al. Dr. Muricy, 915), (41) 3321-4786. De terça à sexta, das 10h às 19h. Sábado e domingo das 10h às 16h. Entrada franca. Até 9 de agosto.
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