Em bom português, Inês Pedrosa usa com desenvoltura recursos da língua que, para os brasileiros, podem soar tão estranhos quanto um idioma estrangeiro. Isso acontece com a mesóclise, "fá-lo-ia" para dizer que faria o livro. Em outros momentos, surgem cês que já não existem no Brasil, como em "projecto" ou "reflectem". Pela forma como constroem frases ou expõem idéias, há um quê poético no falar português ou é possível que esse efeito seja privilégio somente dos escritores portugueses.
Muito atenciosa ao responder as questões sobre seu primeiro romance, A Instrução dos Amantes, que acaba de sair no Brasil 14 anos depois de ter sido lançado em Portugal , Inês fala do passado com bastante tranqüilidade. Perguntada se faria alguma crítica à escritora que era em 1992, ela diz que a idéia nunca lhe ocorreu. "Não vivo a auto-punir-me, aceito cada fase tal como ela é." Porém, se pudesse reescrever A Instrução dos Amantes, talvez o fizesse mais "desgrenhado", "com uma narrativa menos estruturada, mais cubista, aparentemente mais ousada". Em seguida, reconhece o valor da obra tal como é, "a própria idéia de contar uma história do princípio ao fim faz parte do encantamento de um primeiro romance".
É razoável imaginar que um livro de estréia envolva um tanto de ansiedade por parte do autor em querer dizer muito. Esse sentimento marcou sua escrita? "Não; queria só relatar a vertigem iluminada e negra da adolescência, que é a época da vida onde de repente surgem em nós as grandes indagações sobre o sentido da nossa passagem por este mundo."
Para Inês, todo romance fala de amor. Os seus não são diferentes. "Não conheço nenhum ser humano que não sonhe perder a cabeça metaforicamente, claro pelo menos uma vez na vida. Mas interesso-me muito mais pelo amor que fica depois de voltarmos a recuperar a cabeça. Esse é que é raro, árduo, estimulante o amor que começa onde as telenovelas e os contos de fadas acabam."
Adolescência
A escritora afirma que não procura temas sobre os quais falar em seus livros, ela simplesmente os encontra. Em ordem cronólogica. A Instrução dos Amantes fala sobre as experiências da adolescência. Já a origem de Nas Tuas Mãos está ligada à história que ouviu sobre uma mulher em um casamento de fachada, que conviveu com o marido e o amante do marido, sem contar nada a ninguém, por muito tempo. "Essa mulher que não conheci tornou-se uma obsessão, aparecia-me em sonhos, velha e solitária, pedindo-me que falasse com ela e tentasse compreendê-la."
Fazes-Me Falta foi o reflexo de uma época em que várias pessoas muito próximas da escritora morreram, quase ao mesmo tempo, em uma coincidência mórbida. "Um dia, apareceu-me aquela mulher acabada de morrer, sussurrando-me ao ouvido, e procurando fazer-se ouvir por um amigo que abandonara uns anos antes da morte. Esse foi o único romance que escrevi integralmente à mão, de um jacto, como se fosse apenas uma intermediária daquela mulher e daquele homem que faziam o balanço das suas vidas, um para o outro."
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