Desapego on-line

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Há três meses, diante de uma mudança de apartamento, comecei a empacotar minhas roupas e notei que tinha peças demais. Ocupavam dois guarda-roupas e eram suficientes para encher um cômodo inteiro. Também notei que quase nunca havia usado algumas daquelas roupas e sapatos. Uma, duas, no máximo três vezes. Porque as comprei por impulso, porque estavam em promoção ou porque fui vítima de uma paixão à primeira vista, dessas que duram pouco mais de um mês.

Ao mesmo tempo em que precisava desocupar os armários que pertenciam ao apartamento alugado, procurava uma maneira de restabelecer minhas finanças, prejudicadas por uma viagem de férias e uma reforma interminável. Decidi colocar em prática uma ideia antiga e não executada por pura preguiça: criar um blog para vender as peças de que eu já não gostava.

O início foi engraçado. Nunca havia reservado uma noite para fotografar minhas próprias roupas, esticadas sobre a mesa de jantar. Como apenas o retrato não dá uma dimensão exata do caimento do tecido, me vi obrigada a ler as etiquetas – coisa que também nunca havia parado para fazer – para poder informar às minhas futuras clientes, por exemplo, a porcentagem correta de viscose e elastano presentes naquele vestido modelo anos 20.

Definir os preços também foi algo que tomou bastante tempo. Já nem lembrava quais haviam sido os valores pagos por cada peça. Sabia apenas que não queria cobrar caro, caso contrário ninguém as compraria, eu pensava. Acabei fazendo uma relação entre o preço aproximado de cada peça e o número de vezes que as usei.

Depois de postar as fotos, não sabia como e para quem divulgar o endereço do meu Flickr, que batizei de Garage Sale da Ju. Já era de madrugada, eu estava cansada após tantas horas em frente ao computador, então resolvi deixar a divulgação para o dia seguinte. De manhã, ao acordar, foi como um passe de mágica: garotas que eu não conhecia haviam deixado comentários nas fotos, solicitando preços e medidas das roupas. Descobri uma comunidade imensa de pessoas que estavam fazendo o mesmo que eu no Flickr e fiquei bastante surpresa, pois não fazia ideia da existência desse "mercado paralelo" de moda.

Vendi sapatos e roupas para meninas de São Paulo, Rio de Janeiro e outras localidades Brasil afora. As primeiras clientes, inclusive, me ensinaram os trâmites para calcular o frete e despachar os produtos da forma mais econômica. Sempre muito solícitas e simpáticas. Logo, minhas colegas de trabalho também souberam da minha "lojinha" e pediram para conferir algumas das peças ao vivo. Aos poucos, acumulei algumas centenas de reais e reduzi meu guarda-roupas ao tamanho necessário.

Atualmente meu Flickr anda um tanto quanto parado. Mas pretendo retomá-lo em breve, durante a sessão-desapego das roupas de inverno. No entanto, já sei que não terei muitas peças para vender. A experiência de reciclar meu guarda-roupas mudou para sempre minha relação com o consumo de novas peças. Já não consigo mais comprar por impulso, nem armazenar roupas que não uso. Prefiro passá-las adiante e fazer a alegria de desconhecidas virtuais.

Serviço

www.flickr.com/photos/garagesaledaju